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terça-feira, junho 23, 2020

Memória anos 70

No outro dia a RTP Memória surpreendeu-nos com a transmissão de um documentário sobre as tradições religiosas de Castelo Novo e o calendário agrícola. As filmagens remetem-nos para o ano de 1973 do século XX e são uma viagem pela preparação das festas do Corpo de Deus.

«Ensaio» é o título do documentário que pode revisitar nestes dois links:

https://arquivos.rtp.pt/conteudos/castelo-velho-castelo-novo-parte-i/

Neste vídeo observamos o cruzeiro, estradas romanas, vista geral, castelo, lagareta (ruína romana); declarações de José Falcão, presidente da Junta de Freguesia, junto a cruzeiro, sobre a Freguesia e a emigração, intercaladas com imagens de brasão na fachada da Casa da Família Falcão, Chafariz Fundeiro, frontaria da Igreja Matriz, varanda de madeira, fachada de capela e detalhes do sino e da cruz, pormenores de janelas e ruas. 

Seguem-se "Os Trabalhos do Campo": camponesas a sacharem milho; comentários de camponesas sobre o trabalho agrícola e a família; declarações de José Falcão, sobre a antiga fábrica de lanifícios, intercaladas com imagens do edifício fabril degradado. 

"A Urdidura do Fio": fios de linho esticados; caixa com novelos de algodão; Maria Saraiva, urdideira, a trabalhar o fio de linho e declarações da mesma sobre a atividade, os utensílios usados e a vida familiar; vista geral de Castelo Novo; capela: detalhe de sino e escadaria; jornalista entrevista José Falcão sobre as Festas do Corpo de Deus e o leilão de beneficência; fiéis em frente à Igreja Matriz. 

"A Procissão do Corpo de Deus": procissão do Corpo de Deus: pessoas a sair da Igreja Matriz, a descer as ruas, a passar junto do Pelourinho e à Casa da Câmara; torre com relógio; movimento de rua.

https://arquivos.rtp.pt/conteudos/castelo-velho-castelo-novo-parte-ii/


Na preparação das festas: homem a acender e a largar foguete, mulheres com criança pela mão, mesas ao ar livre com fruta, habitantes a conviverem. 

"O Leilão das Fogaças": leilão das fogaças, homem em cima de mesas a leiloar coelho, mesas com as fogaças e populares à volta; comentários de populares sobre a aldeia, intercalados com imagens de leilão, janela com flores e roupa estendida, ruas de Castelo Novo e fachadas de edifícios e mulher em soleira de porta. 

"Conversa com o Pregoeiro": entrevista a José António Campos, leiloeiro e trabalhador da construção civil, sobre as suas profissões e o interesse em morar em Castelo Novo, intercalados com vista geral da Serra da Gardunha e fachadas de edifícios; declarações de José Falcão sobre o regresso de naturais a Castelo Novo, durante as festas populares e após a reforma, intercaladas com imagens do castelo, alpendre em edifício degradado, vasos de flores em fachadas de edifícios e criança à janela. 

Comentários de José António Campos sobre as diversões existentes em Castelo Novo e as ocupações dos jovens; altifalante em árvore.

 "O Baile": jovens a dançarem em baile na rua e pessoas a assistirem; declarações de José Falcão sobre a Liga de Amigos de Castelo Novo e as infraestruturas planeadas para a aldeia, intercaladas com imagens de homem a trabalhar no campo, fonte e muralha do castelo.

José Falcão, visionário presidente de junta de freguesia num território que chegou a ser sede de concelho e no qual desde sempre se elege a Gardunha, a frescura da água do Alardo e o turismo como elementos de capacitação e valorização da aldeia.

terça-feira, abril 30, 2019

Onde é que te gastas?


Onde é que te gastas é uma pergunta bastante comum entre amig@s e significa que queremos saber onde tens andado. O que tens feito. E que terão feito os meus leitores do «De Castelo Novo para o Mundo»?

Por certo, algumas pessoas terão dado pela minha ausência!

Tenho trabalhado bastante. A missão de facilitar a comunicação absorve-me sobremaneira. Depois há o compromisso semanal de realizar o meu «Porque Hoje é Domingo» https://www.mixcloud.com/dulcegabriel58/  na Rádio Cova da Beira.

Ultimamente dedico-me pouco à reportagem escrita e aos dizeres daqui…
Às palavras que saem ao sabor da pena….

No outro dia uma companheira de jornada disse-me que passou a escrever no seu blogue uma vez por semana (www.nuncamaisesabado.net) e também me explicou que se obriga a fazê-lo pelo menos uma vez por semana.

Está explicada a razão do «Nunca mais é Sábado»! Vão lá ler.

Também fiquei entusiasmada. De tal forma que abri esta janela para o mundo e observei que não publico aqui nada desde dezembro de 2018.

Raios!

De então para cá fiz tantos passeios, acompanhei concertos e outros eventos. Celebrei a vida e a amizade. Também fui surpreendida pela visita de uma amiga de sempre e fomos à neve.

Até parece que estou longe desse cartaz maior que é a serra da Estrela!

“Dá Deus as nozes a quem não tem dentes”, já diziam os antigos e têm muita razão. Afinal a Estrela vê-se de todas as janelas da minha geografia e rotinas diárias!
Como diria o diretor do Jornal do Fundão, “são os custos da interioridade”!

E destes a gente gosta.

E que tenho feito, além de comunicar?

Perdi um amigo de sempre e não contive as lágrimas pela partida do João Martins. Um amigo de família que pelo menos uma vez foi protagonista dos meus apontamentos. https://apaixonadapelavida.blogspot.com/2016/11/gestos-e-afetos.html

Em dezembro último estivémos juntos. 




O João partiu semanas depois.

Neste tempo passou um século sobre o nascimento do meu pai. Foi a dia 10 de abril. 100 anos de nascimento de João Gabriel. Saudades tuas, meu pai de ouro. Ainda não consegui escrever o livro sobre o último guarda-florestal de Castelo Novo. A seu tempo, paizinho. A seu tempo!

Neste entretanto completei mais um aniversário, reuni amig@s e familiares.
Retomei o hábito antigo de ir, com regularidade, aos concertos que se fazem nas nossas salas de espetáculos. Também tenho passeado.

Dos concertos guardo a memórias das melhores companhias e a revisitação de grandes canções. No outro dia fascinei-me com «The Gift», revivi a vida com «Resistência» e descobri «Rubel».

https://youtu.be/A8ukTfUJUj8

Das canções às traições vai alguma distância mas a música também significa valorizar o património imaterial dos territórios. E na última Quaresma o meu Fundão promoveu espetáculos de encher a alma.

Num dia de abril fui à Capela de São Francisco, no Fundão, e assisti ao  concerto Martyrio, protagonizado pelo coro comunitário Ensemble Renovatio. Martyrio é o resultado do projeto de criação LACE – Laboratórios de Criação Etnográfica para a Quadragésima, que este ano teve por tema “coro como unidade de criação”. A tradição oral dos cânticos quaresmais da Beira foi, então, interpretada por um coro comunitário – Ensemble Renovatio – com direção artística de Susana Quaresma e Mariana Zenha.




Foi lindo! 
Às tantas senti-me em Castelo Novo a ouvir as pessoas da minha Aldeia a interpretarem os martírios de lá.

Maravilhosa foi a jornada em que a ida à Moagem para assistir a um documentário sobre profissões em vias de extinção me dei conta de como valorizamos tão pouco as nossas pessoas e as marcas que esses protagonistas deixam nos lugares outrora mais povoados.

Foi lá que conheci Rodolfo Nuno Anes Silveira. Licenciado em Cinema e Comunicação Multimédia pela Universidade Lusófona, Rodolfo tem raízes nos Três Povos (Fundão), vive em Munique (Alemanha) e está fazer doutorando em Media Artes, na UBI- Universidade da Beira Interior.
Coordenador de estudos da Universidade de Televisão e Filmes de Munique (Hochschule für Fernsehen und Film - HFF), Rodolfo Silveira estava acompanhado de Daniel Lang da mesma universidade. 



Um e outro promoveram na região uma recolha sobre ofícios em desuso e através da técnica “falar com imagens” reuniram um conjunto de curtas-metragens que nos ajudaram a redescobrir um ferreiro, um cesteiro, uma tecedeira, um padeiro e um construtor de pífaros.

Artes e ofícios em vias de extinção num documentário notável que será apresentado no Festival de Cinema Documental de Munique (DOKFEST) no próximo mês de maio.

Fiquei orgulhosa daqueles jovens que assim nos levaram até ao Jarmelo, Alcongosta, Janeiro de Cima, Silvares e Três Povos.
É bom quando os trilhos da vida nos cruzam com pessoas assim.

Até outro instante!

sexta-feira, junho 01, 2018

Cem Anos e uma Vida Feliz


Apresento-vos a centenária Maria de Lourdes Videira. Nasceu na cidade mais alta, veio para o Fundão ainda bebé e completa no dia 3 de junho 100 anos. Uma centena de anos de uma vida feliz. Contou-me no dia em que me recebeu em sua casa, no centro da cidade do Fundão, para gravarmos a conversa que passará na Rádio Cova da Beira, no programa “Porque Hoje é Domingo” exatamente à mesma hora em que na igreja matriz do Fundão decorrerá a eucaristia que assinalará o centenário de Lurdinhas Paulouro.



“Lurdinhas” pela dedicação que familiares e amigos têm para com a viúva de Armando Paulouro, o militar com que Maria de Lourdes Videira se casou depois de 26 anos de namoro à distância. “O meu marido passou muitos anos nos Açores e umas vezes queria casar, outras nem tanto. Escrevia-me muitas cartas de amor, mais do que eu!”. Descreve Lourdes Videira que embora não tenha adotado o nome da família Paulouro, é conhecida de todos os fundanenses como Lourdes Paulouro.

Na conversa divertida e intimista na sala de estar de um apartamento na rua Vasco da Gama, Lourdes Videira confessa-nos que gostaria de ter sido atriz. “Eu quando via o palco, corria para lá e só me imaginava ali a demonstrar o que eu gostava de fazer. Mas eu tinha uma vida muito presa. Não gostava de deixar os meus pais sozinhos e também não tive grandes oportunidades de estudar”, revela-nos ainda quem abriu no Fundão o primeiro colégio privado para as crianças. No entanto, o mesmo deixou de existir quando chegaram ao Fundão as Irmãs Franciscanas que criaram na Misericórdia um outro colégio que praticava “preços mais baixos” e lhe acabou com o projeto, descreve.

Além da educação infantil baseada na pedagogia de João de Deus Ramos *, Lourdes Paulouro desenvolveu, até aos 70 anos, um percurso profissional em boa parte foi dedicado ao combate à tuberculose. “Quando as Freiras me acabaram com o colégio, havia muitas famílias com tuberculose e Monsenhor Santos Carreto**, convidou-me para trabalhar no Dispensário de Tuberculose”. “Ajudei muitas famílias. Nos anos cinquenta ia às barracas dos ciganos dar injeções e fazer inquéritos para avaliar a evolução do surto da doença nas Minas da Panasqueira e na Covilhã”, explicou quem também exerceu funções de assistente social e reportava “diretamente ao diretor geral de saúde”.

Entusiasmada com as memórias de uma vida sempre “bastante ativa” a minha entrevistada orgulha-se de ter tido “a melhor nota – 16 valores – do seu ano no bacharelato de ação social”. Ao mesmo tempo lamenta não ter podido inscrever-se na licenciatura por “questões económicas”.

É única viva das três filhas do casal Emília Castro e Silva e João Videira. Com o sorriso contagiante que todoa a gente lhe reconhece, Maria de Lourdes conta ainda que o seu pai, “enquanto militar foi o único português que deu um duplo salto numa cerimónia oficial para a Rainha Dona Amélia”.  

O percurso de vida da viúva de Armando Paulouro, que durante vários mandatos foi secretário de sucessivas mesas administrativas da Santa Casa da Misericórdia do Fundão, cruza-se com a vida moderna da Misericórdia e do Hospital do Fundão onde chegou a trabalhar quando o serviço local de Luta Contra a Tuberculose passou para a alçada do Hospital local.

Uma vida de bem-fazer que cedo começou a desenhar-se pois aos doze anos, “quando ainda estudava num colégio na Guarda, um Missionário que foi visitar-nos perguntou se alguém se voluntariava para o acompanhar em África. Coloquei-me em cima de uma cadeira e ofereci-me para ir, mas era uma criança”, esclarece.

Diante a atenção da sobrinha Ana Emília Junqueiro que assiste à conversa, Maria de Lourdes socorre-se da memória fotográfica das muitas vivências e lugares emblemáticos do seu Fundão: O cinema Gardunha, o colégio de Santo António (onde conheceu o amor da sua vida) ou o Casino Fundanense dos bailes e outros encontros cujas lembranças vivenciadas povoam a conversa que durou mais de duas horas.

Já no final da gravação da entrevista sugeriu que a sobrinha me ofertasse um exemplar da revista satírica “O Mundo Ri” que durante anos foi desenvolvida por Armando Paulouro, José Vilhena e Simões Nunes. A publicação cujo número 103, datado de novembro de 1960, está agora na minha biblioteca custava 4$00 escudos.  



Certamente que a revista que perturbava a PIDE continuará a fazer parte das leituras de quem gosta imenso de ler. Camões está entre os clássicos mas hoje em dia lê  “livros mais leves” – terminou agora a leitura de “Fellini na Praça Velha”, da autoria de seu sobrinho Fernando Paulouro Neves.

O dia de Maria de Lourdes começa de manhã com as rotinas normais de quem gosta de vestir “toaletes que me fiquem e façam sentir bem”. “Vou sempre almoçar fora de casa e todos os dias tomo chá ou café com as minhas amigas. Não gosto de estar em casa”, confirma.

Autónoma e saudável, “só vai ao médico quando é obrigada”, escreve e lê sem precisar de óculos. Não sabe o que são diabetes, colesterol elevado ou tensão arterial irregular e diz-nos que o segredo é “estar sempre bem”.

E ficará ainda melhor quando este domingo presenciar na festa surpresa do centenário de nascimento um punhado de amigos, sobrinhos, sobrinhos netos e alguns bisnetos.

Será um momento inesquecível. Como inesquecível foi o pedaço da tarde de dia 31 de maio de 2018, o dia da gravação de uma conversa que reforça a ideia de bondade, pluralidade e modernidade da senhora Maria de Lourdes Videira.

*João de Deus Ramos era filho do pedagogo e poeta João de Deus e de D. Guilhermina Battaglia Ramos. João de Deus Ramos é  autor, entre outras, das seguintes obras sobre pedagogia: Reforma da Instrução Primária, 1911; A Reforma do Ensino Normal, 1912; O Estado Mestre Escola e a Necessidade das Escolas Primárias Superiores, 1924; A Criança em Portugal antes da Educação Infantil, 1940 – in Wikipédia
** Monsenhor Santos Carreto foi Sacerdote e Reitor do Seminário do Fundão

quarta-feira, abril 19, 2017

Canções com Memória

Diz o poema da canção que hoje ecoará no Meo Arena


"Quantas vezes me sinto perdido 

No meio da noite Com problemas e angústias Que só gente grande é que tem Me afagando os cabelos Você certamente diria Amanhã de manhã você vai se sair muito bem Quando eu era criança Podia chorar nos seus braços E ouvir tanta coisa bonita Na minha aflição Nos momentos alegres Sentado ao seu lado, eu sorria E, nas horas difíceis Podia apertar sua mão" (...)


O tema belissimamente interpretado por Roberto Carlos é umas das minhas canções de e para a vida. O Rei completa hoje 76 anos. Minha mãe teria completado 72 e meu pai teria no dia 10 de abril alcançado a bonita fronteira dos 98.



Que têm meus pais a ver com uma das mais nostálgicas canções de Roberto Carlos?



Tudo.



Aprendi a ouvir Roberto Carlos nos anos 80 do século XX com os meus pais. Na Gardunha não havia televisão e naquela época também não havia consolas. Eu também não tinha muitos brinquedos nem bonecas. Na tranquilidade (hoje recordo assim a serra da Gardunha) ou na pasmaceira dos dias passados na solidão de que mora na floresta, as horas eram passadas na companhia dos pais e da minha irmã três anos mais nova. 



Aos domingos à tarde, quando as temperaturas o permitiam, trazíamos o rádio para as escadas da casa e sintonizávamos a onde média da Rádio Altitude. Apesar de na aldeia as tardes de domingo serem propícias aos bailaricos no salão paroquial, eu permanecia na serra e ouvia os discos pedidos ( sim, naqueles anos a telefonia também dedicava discos e aproximava pessoas ou era remédio contra a solidão!) ao lado da mãe Patrocínia.



Levantávamos o volume do Rádio e mesmo que meus pais se entregassem à rega, à sacha ou às tarefas do campo, havia a certeza de que nenhum de nós perderia o programa emitido a partir da cidade mais alta.



Também havia momentos de pura empatia. Eu e a mãe chegávamos a cantarolar juntas. Às vezes também me sentava na perna direita de meu pai que guardava a esquerda para a mana Paula e fazia cavalinho connosco.



Ali ficávamos a contemplar a paisagem verde, às vezes já com tonalidades de verão e outono, e a receber do mimo incondicional dos progenitores.



"Lady Laura" é uma dessas canções intemporais que, além de um saudosismo profundamente melancólico, me faz recuar ao tempo em que sendo criança me fiz adulta e mulher precoce.  Interiorizava o significado de cada uma das quadras da canção interpretada pelo lendário musico que neste 19 de abril de 2017 regressa a Portugal para um concerto que há-de ser memorável.



Às vezes, ou muitas vezes, as canções devolvem-me a lembrança dos dias andados, dos caminhos cruzados com a Gardunha ou outras paragens bem mais planas mas igualmente pejadas de boas lembranças a ouvir as canções do Rei.


E aqui vos deixo outra

https://www.youtube.com/watch?v=54xxnkXqltw

E mais outra

https://www.youtube.com/watch?v=3fuzoSGTNOo

Por razões diferentes são canções com memória.





quarta-feira, novembro 16, 2016

Em Memória de um Guardião

Quando nos despedimos de um fiel depositário da memória sentimos nostalgia mas também insegurança e fragilidade.
Ontem partiu um guardião da memória e das boas práticas das Obras de Misericórdia. Um homem com um enorme sentido de responsabilidade e apego às causas e dores de uma das mais nobres instituições do Fundão.
Eurico Ramos, irmão da Misericórdia do Fundão desde novembro de 1971. 


Conheci-o há muitos anos. Poderei dizer que o percurso do irmão e dirigente da Santa Casa da Misericórdia do Fundão se cruzou com o da jornalista em mais de duas décadas. Eurico Ramos era um homem cordial e compreensivo.
Mesmo em tempo de "guerras" e dificuldades de maior nunca lhe ouvi uma resposta torta ou uma observação menos própria, narrativa tão comum quando o jornalista quer ir além do óbvio.
Quis o destino que um dia me cruzasse e privasse com o senhor Eurico Ramos numa outra condição. A de colaboradora da Instituição onde Eurico Ramos era dirigente.
Foi durante este tempo que me dei conta de como Eurico Ramos nos observava sem qualquer tipo de sobranceria. Não havia dia, enquanto a saúde lhe o permitiu, que não viesse à Misericórdia deixar um sorriso e demonstrar inequívocos sinais de empenho e dedicação à organização onde esteve ligado mais de quarenta anos.
Ouvi na Rádio uma declaração pública do Provedor da Santa Casa em que Jorge Gaspar manifestava sentido pesar pela perda de um dos mais empenhados e abnegados irmãos da Misericórdia do Fundão. Uma observação perfeita e bem ilustrativa sobre alguém que de forma zelosa cuidava da memória, das tradições e do culto da Santa Casa.  Uma realidade que pude constatar nos anos em que apreendi um bocadinho da experiência de Eurico Ramos na construção e caminhada de cada uma das edições da Semana Santa no Fundão. Um dos mais respeitosos e enriquecedores momentos anuais da vida da Santa Casa começava a ser preparado muitas semanas antes. Eurico Ramos ficava dias agarrado ao telefone e estabelecia contatos, construía pontes e envolvia a comunidade nas tradições Quaresmais. Também no âmbito do culto e das obrigações da Irmandade, plasmadas no livro do Compromissso da Santa Casa, Eurico Ramos recordava com entusiasmo os antepassados da visita dos irmãos aos doentes. Ajudava a identificar as campas dos irmãos falecidos e dava sempre o seu contributo no sentido de nos esclarecer, aos mais jovens colaboradores da Misericórdia, como deveríamos agarrar as situações e proteger a memória coletiva.
Depois, havia o Museu e uma quase ligação umbilical à geografia e história secular da instituição. Os cortejos de oferendas para a construção do hospital do Fundão. Tantas memórias! Tanto saber acumulado. Um dia escrevi que Eurico Ramos era o Guardador de Memórias. De facto a Santa Casa do Fundão e os seus colaboradores estão mais pobres com a partida do fiel depositário da história da Misericórdia. 





Eugénio de Andrade o poeta maior

 Fui à Póvoa. À terra do poeta nascido há uma centena de anos. Encontrei memória falada, orgulho e expetativa quanto à importância de Póvoa ...