terça-feira, novembro 28, 2017

Os Amigos Revelam-se

Num dos textos do livro “O Pequeno Caminho das Grandes Perguntas”, o teólogo José Tolentino Mendonça sugere ao leitor uma reflexão sobre os amigos de perto e de longe. Os que estão sempre presentes e os distantes. Na atitude e no verbo.

Sugere o escritor e poeta que sejamos capazes de valorizar a afeição em vez da posse.

E mesmo quando o desprendimento é uma realidade, Tolentino Mendonça sugere que sejamos capazes de crer na essência da história e na origem dos laços.

E diz o texto:

A etimologia da amizade reenvia-nos, assim, não para uma qualquer experiência casual, mas para a memória daquela afeição primeira que estrutura silenciosamente a existência. Por isso, na sua espantosa leveza, e sem alardes, a amizade dialoga com coisas muito fundas dentro de nós: faz-nos reviver o primeiro amor com que fomos (ou não fomos) amados; toca as nossas feridas, mesmo as que não conseguimos verbalizar; transmite-nos confiança para sermos o que somos e como somos; estimula-nos a progredir vida fora.
Nem todas as nossas amizades chegam a tomar consciência da extraordinária viagem interior que as mobiliza”. (…)



É bem verdade que muitas vezes a amizade não vai além da verbalização de uma palavra mas há sempre a esperança de que os verdadeiros amigos estejam sempre ao nosso lado.
Haja o que houver!

Porém há os dias em que a dúvida se instala e a alma veste-se de negro por sentir que uma e outra vezes, muitas vezes, a amizade deixa de traduzir-se em afeição e passa a ser um termo amplo e sem gesto. Sem o laço genuíno que vinha da primeira e silenciosa estrutura.

É então que nos olhamos ao espelho e nos perguntamos se o defeito é nosso. E se o nosso conceito de amizade e reciprocidade combina com a abordagem prosaica de uma convivência e cumplicidade sem estimulo e carregado de omissões e ingratidão.

Estes têm sido anos para desbravar caminhos, afastar pedras e vencer barreiras.

É também um período da minha vida em que tenho observado os meus amigos. Os de perto e de longe. Os presentes e os ausentes. Os desprendidos que são capazes de surpreender. Pela sua generosidade pela genuinidade de cada gesto!

Quem se lembra de nós, quem gosta de nós, promove. Age. Não omite. Dá continuidade ao registo.

Que me desculpe o José Tolentino Mendonça mas eu preciso de sentir que os meus amigos mesmo distantes estão próximos.

Estão sempre aqui. Chamam por mim. Perguntam como estou. Acompanham o meu percurso. Ouvem, leem e criticam. Dizem presente.

E fundamentalmente não são ingratos.

quinta-feira, novembro 02, 2017

Cemitério de Silêncios


No dia em que toda a gente caminhava para o cemitério subi à Gardunha. A viagem iniciou-se exatamente à porta do cemitério da minha aldeia Natal. Sim, essa terra onde o silêncio geral denota o despovoamento agravado pelos incêndios que deixaram um rasto de destruição e um chão vincadamente negro.

No hora em que o povo descia desde a igreja até à zona baixa de Castelo Novo para ali prestar homenagem aos que jazem no cemitério localizado no sopé da Gardunha, contrariei a tradição, dispensei o momento de oração e silêncio coletivos para mergulhar numa outra geografia, igualmente marcada por um silêncio sepulcral.

Serra acima, numa manhã sombria de novembro e a ameaçar chuva, dei-me conta do vasto cenário carregado de negro.

À primeira paragem, já fora do carro e sem o som da música ambiente, os meus ouvidos fizerem um esforço maior para identificar o chilrear de um melro, um pássaro ou um milhafre ávido de galinhas das capoeiras localizadas nos campos da Gardunha.

Porém as quintas, que foram resistindo à desertificação do território, estão agora reduzidas a cinza e as galinhas ou outros vivos que por lá existiram finaram-se em agosto último.

Assim terá acontecido com as raposas e os coelhos que já se passeavam pela serra e certamente sucumbiram ao calor do inferno das chamas.

É então que a viajante se dá conta do silêncio continuado que a acompanha desde o cemitério de silêncios. Esse lugar onde habitam os nossos entes queridos e que naquele dia de agosto também terão sentido o inferno do fogo.  O bafejar da chama sobre as campas que compõem o "povoado" desse lugar de invariável confluência anual no Dia dos Santos.

O poder do silêncio do cemitério foi de tal forma poderoso que a demorada paragem no outrora paradisíaco lugar da Casa Florestal de Castelo Novo se traduziu em calafrios. A viajante sentiu uma pontinha de medo quanto à ausência de um único barulho. Nem um ruído! Uma folha a cair, a serpentear de um lugar para o outro... Até as pinhas estavam todas no chão!

Não se ouvia uma mosca. Nem havia sinais de vivalma. A água escasseia e não encharca os terrenos à volta do tanque que se apresentava quase vazio. 
Da bica corre um fio do precioso líquido e nem me atrevo a bebê-la pois os incêndios foram há pouco tempo e as chuvas ainda não apaziguaram o manto de cinzas.
São tantos os sinais a adensar o cemitério de silêncios que até as lágrimas do viajante secaram. A descrença tolhe-nos o olhar e na alma lembra-nos que quase nada nos prende áquele lugar.

O fogo de há dois meses e meio levou outra vez o verde da Gardunha e agora a viajante só consegue identificar os lugares onde tantas pessoas foram felizes!

Embora a Casa Florestal de Castelo Novo permaneça intacta, aquela geografia é, também ela, um cemitério de silêncios. Desapareceu tudo!

Os mosquitos, as moscas, as aves, as raposas e os coelhos.

As árvores que já estavam a reerguer-se, depois do fogo de há doze anos, também pereceram e delas restam apenas pequenos troncos dos quais haverá de rebentar uma nova planta. 

Uma renovada réstia de fé num amanhã outra vez verdejante e esplendorosamente belo.

Mas nessa altura a viajante e os amantes da Gardunha continuarão a questionar-se quanto ao abandono a que está votada a Casa Florestal. 




Consequentemente lamentarão o avanço da degradação do imóvel onde permanecem os azulejos com letras azuis escuras a dizer “Matas Nacionais”.

Elegantes e com letras bem definidas, os azulejos (felizmente a mão alheia não os roubou!) estão geometricamente colocados na lateral da casa. Estão “esculpidos” sobre a janela do quarto da viajante que uma vez criança, ali sonhou com uma Gardunha sempre romântica e cheia de vida,

É na Mata Nacional do perímetro de Castelo Novo que a memória conduz o narrador para o tempo em que debaixo dos imponentes cedros havia bancos e uma mesa hexagonal de granito que alguém fez desaparecer.

Na antiga sala de visitas da Gardunha para Castelo Novo e com a Raia no horizonte, também havia arbustos e bancos onde o guarda-florestal recebia outros viajantes e amantes da sua serra. 

Ali, o guardião da fauna e da flora da Gardunha fez tantos amigos como cerejas e também essas deixaram de povoar aquela zona da Gardunha.


Aqui está uma explicação poética para o vazio que agora se instala na última mesa localizada nas imediações da Casa Florestal de Castelo Novo e onde o silêncio chega a embrenhar-se na pele do viajante. 



É então que a viajante, narradora e saudosista da sua Gardunha fixa o olhar naquela mesa e lamenta que o destino e os erros do homem tenham feito do seu jardim um cemitério de silêncio localizado na encruzilhada das causas e consequência do fogo.

Numa tentativa de enriquecer a narrativa que comprova o sentimento de quem passou a manhã no silêncio da Gardunha, penso num poema suficientemente rico e que seja capaz de traduzir a mágoa que fica do reencontro com as pessoas e lugares que me fizeram mulher.

Lembrei-me de Pessoa.

Na pesquisa encontrei Álvaro de Campos

E diz o poema:


Penso em ti no silêncio da noite, quando tudo é nada,
Penso em ti no silêncio da noite, quando tudo é nada,
E os ruídos que há no silêncio são o próprio silêncio,
Então, sozinho de mim, passageiro parado
De uma viagem em Deus, inutilmente penso em ti.
Todo o passado, em que foste um momento eterno
E como este silêncio de tudo.
Todo o perdido, em que foste o que mais perdi,
É como estes ruídos,
Todo o inútil, em que foste o que não houvera de ser
É como o nada por ser neste silêncio noturno.
Tenho visto morrer, ou ouvido que morrem,
Quantos amei ou conheci,
Tenho visto não saber mais nada deles de tantos que foram
Comigo, e pouco importa se foi um homem ou uma conversa;
Ou um [. . .] assustado e mudo,
E o mundo hoje para mim é um cemitério de noite
Branco e negro de campas e [. . .] e de luar alheio
E é neste sossego absurdo de mim e de tudo que penso em ti.


s. d. Álvaro de Campos — Livro de Versos . Fernando Pessoa. (Edição crítica. Introdução, transcrição, organização e notas de Teresa Rita Lopes.) Lisboa: Estampa, 1993: 174.

quinta-feira, outubro 26, 2017

Um Encontro Inesperado

O que nós somos e como a vida nos transforma.

Obrigações de natureza profissional levaram-me hoje à Quinta Pedagógica do Fundão para acompanhar um workshop sobre estimulação sensorial.

Estavam lá dezenas de séniores.

De repente há uma mão que me acena, uns olhos que quase saltam do rosto e não escondem um misto de emoção e alegria.

Ao mesmo tempo há uma voz trémula que chama por mim. Aproximo-me ainda mais e reconheço o senhor Américo.

O meu tio Américo!

Quem o viu e quem o vê.

O homem do campo que criava gado e cuidava das hortas, o homem que a dureza da vida obrigou a ser rijo e rude é hoje um ser indefeso.

A idade e a doença apoderaram-se de um dos últimos guardadores de rebanhos da Gardunha.
A minha serra que também é a dele foi devastada pelo último crime contra a nossa floresta.
As chamas que tudo lamberam e devastaram as enconstas onde meu tio tantas vezes picou os dedos a apanhar castanhas.

As melhores castanhas cá da terra eram as do tio Américo.

Eram! Disse bem. Pois o efeito do fogo e a fragilidade humana do tio Américo colocarão em causa a produção de castanha.

Se é que a mesma já não estava suspensa!

O Tio Américo há muito tempo que havia deixado a vida no campo e até já tinha trocado a casa localizada junto à ribeira de Alpreade por outra mais confortável e de fácil acesso no centro da Aldeia Histórica de Castelo Novo.

Anos antes, muito anos antes, o tio Américo foi um dos resistentes das intempéries e da inclemência do fogo.
Quantas vezes as chamas varreram a "serra dos correias" e a "pelada" na enconta da Gardunha que faz fronteira com Alcongosta?

Tantas vezes a neve, o vento gélido e os incêndios o fizeram gritar "ai Jesus"!

Hoje em dia o suspiro e a crença prendem-se com outras dores e provações.

A falta de saúde e uma inesperada cirurgia atiram-no para a Unidade de Cuidados Continuados do Fundão.

Hoje encontrei-o numa daquelas jornadas em que os técnicos de saúde e as equipas de animação da Santa Casa da Misericórdia do Fundão acrescentaram vida aos anos do tio Américo e de todos os outros idosos que com ele estavam reunidos na Quinta Pedagógica do Fundão.




Entre os exercícios e as músicas de antigamente o meu tio Américo lá confessou que gosta de ali estar e que o tratam bem. De lágrima estendida na face direita do rosto mais magro e menos corado, o tio Américo confidenciou-me que a tia Adelina também está doente. "Teve um problema e tem estado no hospital mas o mal já está curado, amanhã vai para casa", explicou-me.

Dentro de dias prometo ir ao encontro do meu tio. Talvez lhe faça bem ver uma cara mais familiar ! Talvez, nessa ou noutras visitas "de médico", eu seja capaz de o fazer recuar no tempo e ele me conte sobre a labuta de antigamente.

A criação de gado. Os cabritos. As peles que vendia a 1.500 escudos. Os queijos. O essencial de uma vida nos campos que as chamas reduziram a cinza!

Oxalá essas vivências de homem da Gardunha continuem registadas na memória de quem enriquece o meu baú de recordações em família!







terça-feira, outubro 24, 2017

Bem-Haja

Há uma música do Caetano Veloso que diz assim:
(…) Quando a gente gosta 
É claro que a gente cuida  (…)

A letra de “sozinho” pode parecer que aparece aqui desgarrada daquilo que me proponho partilhar com os leitores. Mas não!
A mesma encaixa no desabafo digital que observei há dois dias quando um jovem empreendedor manifestava admiração e gratidão por aqueles que são capazes de elogiar e dar força para o caminho.

Efetivamente, não conheço ninguém que não goste de uma palavra de felicitações, um aplauso pelo êxito de uma iniciativa ou pela perspetiva de afirmação de um projeto.

Mas, na verdade, também não conheço muita gente capaz de nos transmitir uma palavra de apreço ou regozijo pelo nosso êxito.
E aqui entra o elogio. Elogiar não tem de ser subserviência ou bajulice.  

Mas convenhamos que um elogio faz bem! Enche-nos de orgulho, estimula-nos a entrega, o sentido guerreiro, o apego às nossas causas.
Porém, quem é capaz de nos dar um elogio sem segundas intenções? Quem é capaz de reconhecer com honestidade os nossos passos ou o percurso adotado?

Lembrem-se lá!
Digam-me que estou a ser bastante injusta. Digam qual foi a última vez que o vosso chefe elogiou o vosso trabalho?

E aqui lembro-me imediatamente de António Paulouro. O fundador do Jornal do Fundão e da Rádio que me preencheu a vida durante 22 anos, nunca me fez um telefonema para enaltecer um noticiário. Nunca! De cada vez que o telefone da redação da Rádio JF tocava era sempre para criticar, exigir, sugerir.

Às vezes sentíamo-nos deprimidas com a frieza das palavras, com a ausência de um gesto de satisfação pelo empenho e dedicação dos que escreviam, produziam e apresentavam as notícias.

Mas António Paulouro ouvia os noticiários. E puxava por nós! Também nos surpreendia com questões de natureza literária e ai de quem não estivesse a ler um livro!

Agora que observo a gratidão do jovem empreendedor pelo reconhecimento e odes ao seu percurso empresarial, recordo-me de António Paulouro e só posso estar-lhe grata pela atenção que dava ao meu trabalho. Ao nosso trabalho coletivo.
Bem-haja António Paulouro!

Se outros lhe seguissem o exemplo, certamente muitos menos se sentiriam órfãos no seu trilho laborioso.


terça-feira, outubro 03, 2017

Uma Doçura de Teimosia

Qualquer dia faz dezasseis anos. Está uma mulher!
Há maneira que os anos avançam o perfil de menina torna-se mais refinado e damos-nos conta do quão parecidas somos.

Lá em casa as semelhanças dão um jeitão à classe masculina do clã. Vezes sem conta ouve-se uma voz mais poderosa e rabujenta que nos lembra a autenticidade dos nossos traços e modos de agir. 
- És mesmo como a tua mãe! 
A tirada do mais adulto homem da casa quase sempre tem resposta. E a mesma traduz-se numa estridente e cumplice gargalhada.

Mas como em tudo na vida, a rotina nem sempre veste azul ou transborda as cores do arco-íris. 
A Nina, como lhe chamo desde bebé, é uma doçura de teimosia. O modo de ser e as reações intempestivas que herdou da progenitora, quase sempre seladas com um ruidoso bater de porta, desaparecem instantes depois.
Na terminologia moderna chamar-lhe-ia bipolar. Mas eu, que sou tão igual a ela, perfiro caracterizá-la como mau feitio.

E o que é ter mau feitio, ser intempestiva ou bipolar?
Não quereremos dizer que somos determinadas? Exigentes...

A menina quase mulher é, efectivamente, uma rapariga determinada. Na escola, no desporto e nas relações interpessoais.

Os últimos tempos não têm sido fáceis pois o clã passou de cinco para quatro elementos. 
A "Judite Sousa" lá de casa está menos perto de nós. Menos presente. Ainda que seja um afastamento físico nenhum de nós esconde que temos saudades dos monólogos da "Judite Sousa" e da forma organizada e metódica que desde sempre caracterizam o seu percurso.

É diante esta realidade que o par de intempestivas reganha uma cumplicidade adormecida. 

A distância forçada de um deixou mais espaço e tempo para a mau feitio mor  renovar os laços umbilicais com a nadadora e pianista que sonha ter muitos filhos e casar com um homem rico.

Sim, o leitor percebeu bem! A Nina quer ser uma mãe de mão cheia. Contudo, não será a fada do lar.

Nós, pessoas determinadas e audazes, temos um enorme apego à família e alimentamos o cordão umbilical mas também queremos voar!

Voemos! Sejamos sempre uma doçura de teimosia. Nem que seja para que o Tiquita tenha a certeza que também o amamos muito. Tiquita será sempre o benjamim da família. E os traços de doçura teimosa já começam a dar sinais.

E agora que a prosa intimista chega aos fim, apetece-me dizer-vos: A Nina, que é sangue do meu sangue e papel químico dos Gabriel, tem sido o nosso amparo.

Ela é forte e determinada. Confia no amor incondicional e sabe promovê-lo.

Que a harmonia e musicalidade continuem a ser a banda sonora de nossas vidas.


quarta-feira, agosto 23, 2017

Hip-Hop no TeatroAgosto

“Antecipar o futuro” é o título de um álbum de canções de Hip-Hop interpretadas por Cevas. Cativou a minha atenção numa das noites da edição XIII do Festival Internacional de Teatro ao Ar Livre que decorre no Fundão até dia 27 de agosto.

Ir ao TeatroAgosto no mês em que a oferta cultural parece mais vocacionada para festas e romarias é uma bênção para quem continua a acreditar que no Interior de Portugal há movida e há quem faça acontecer.



O Festival de Teatro do Fundão é organizado pela ESTE- Estação Teatral. Uma companhia profissional de teatro radicada no Fundão que, a muito custo e movida a balões de oxigénio, consegue promover iniciativas culturais diferenciadoras que também acrescentam notoriedade ao Fundão.

Desde sempre a surpreender direcionando os espetadores e seguidores para o teatro que mergulha na identidade de um território mas também trabalha obras de grandes dramaturgos, a ESTE presenteia-nos a cada Verão com um cartaz cultural que orgulha uma comunidade inteira.

Desta vez o TeatroAgosto volta a brindar-nos com música e já esta noite (23 de agosto) há um Café Concerto - que é solidário pois as entradas revertem a favor da campanha de reflorestação da serra da Gardunha- em que atua “Anita do Brasil”. Ouviremos, então bossa nova, samba e a guitarra carioca interpretada por Miguelão. Antes disso teremos oportunidade de assistir à mais recente produção da ESTE. "Há Beira na revolta" é um espectáculo que reúne quatro histórias de força  e resiliência beirã: A tomada do Carvalhal, A história do Zé de Manteigas, A Rua dos Alves e As Cebolas de Napoleão.Cá está um exemplo de como a recolha e trabalho de laboratório da Estação Teatral nos ajuda a compreender o território!

Não faltam, pois, motivos para estar em mais um serão na Moagem-cidade do engenho e das artes.

Ali, voltando ao princípio deste texto, descobri a paixão e arte do jovem natural do Alcaide “Cevas” que através das letras das suas canções acrescentou criatividade e uma energia vibrante ao Festival de Teatro do Fundão. Antecipando o futuro, Cevas encantou-nos com a nostalgia de um amanhã relacionado com a memória coletiva de um território marcadamente rural e cuja geografia é inspiração para as letras do jovem rapper nascido na década de oitenta.

O Jovem Simple Sample Digger como se identifica nas redes sociais tem a freguesia do Alcaide no coração. Das suas letras brotam palavras de saudosismo quanto à movida na aldeia e convívios citadinos em lugares emblemáticos do seu Fundão. A cidade onde estudou, cresceu e se fez homem e à qual regressou para uma noite de ritmos que entusiasmaram a plateia constituída por fiéis seguidores do percurso do músico que já editou dezenas de álbuns e trabalhou com inúmeros dj´s de Portugal e do estrangeiro.

No TeatroAgosto fez-se acompanhar do Dj Fatinch e na voz fez duos com Uno. Cevas está ligado ao movimento Hip Hop no Fundão e o seu trabalho parece estar a dar frutos. Basta ouvir atentamente um dos mais conhecidos temas do rapaz que foge aos padrões comerciais e coloca em cada letra o seu mais apurado sentido critico denotando a irreverência própria dos criativos. 


e a letra



Observei mais do que falei, fui observador, 
Olhei no ínfimo dos outros, tornei me comunicador, 
Saltei a cerca dos limites sem ser anarquista, '
A vista vês me com ideais universalista. 

Dei mais ouvidos a quem precisou de uma pista certa, 
Aperta a mão que eu te ajudo a ficar alerta, 
Acerta o ritmo de uma vida que dói e infecta, 
E se intersecta em humildade que aceita a recta. 

A identidade que encontrei também te inspira, 
Na mira sou o que sei bem sem ser um akira, 
Prefira eu viver em paz com o que te transpira, 
Na ira estás sem soluções que mingua ou mirra. 

E tudo é grande ou pequeno consoante a estala, 
Dentro da escala a dimensão só ilude a fala, 
Ninguém agrada a toda a gente pela falta de tempo, 
Além do ser mais resiliente existe o consentimento. 

Mantenho o circulo em aberto para a tua entrada, 
Permito noções de unidade de forma ilimitada, 
Onde o limite se estabelece se o que percebeste foi nada, 
O entendimento está para quem sente a mesma bojarda. 

E os que se juntam ao movimento buscam pertencer, 
A uma atitude implacável sem razão de ser, 
Só por valer, prevalecer...
Nem sei se tas a entender....

segunda-feira, agosto 14, 2017

Um concerto com memória

O contador de histórias, Jorge Serafim foi o anfitrião do espetáculo que o coletivo “Tais Quais” apresentou no largo do Calvário na cidade do Fundão numa das mais concorridas noites do Festival Cale&SangriAgosto.

Conhecedor da região onde regressa com alguma frequência para o TeatroAgosto - festival internacional de teatro ao ar livre, Jorge Serafim cativou a plateia com as suas histórias e humor que, de tanto nos fazerem rir, provocam dores no maxilar.

Serafim foi uma espécie de narrador da viagem pela música tradicional alentejana dando entrada aos temas. Cada um mais fantástico que o outro!

Parecia uma noite de canções ao desafio pois os milhares de espectadores deixaram-se envolver no alinhamento do espetáculo que além de Jorge Serafim reuniu no mesmo palco João Gil, Vitorino, Tim, Paulo Ribeiro, Sebastião Santos e Celina Piedade mais Vicente Palma que, a meu ver, fizeram a diferença pela mestria que os caracteriza no toque do acordeão e do piano, respetivamente.

Desconheço se Vicente veio para substituir Jorge Palma que aparecia na formação inicial dos “Tais Quais” mas tenho a certeza que o público que o viu no Teatro Clube de Alpedrinha em dezembro de 2016 confirmou ontem no Fundão o adágio popular que diz “filho de peixe sabe nadar”.
Ao talento de Vicente Palma e Celina Piedade junte-se o não menos performativo e inspirador Sebastião Santos. Na voz e na bateria, o filho de Tim também fez a diferença.
A interpretação do tema “Algibeira” do disco de estreia da banda fez a diferença num espetáculo de matriz alentejana que nos permitiu ver e ouvir Tim dedilhar a viola campaniça ou Paulo Ribeiro interpretar, em modo cante, o tema “circo de Feras” dos Xutos e Pontapés.

Foi uma noite de forte empatia entre músicos e público de todas as idades, com expoente máximo na interpretação de lendários temas de Vitorino como “Menina estás à Janela”. O projeto “Rio Grande” também foi revisitado na interpretação de “Postal dos Correios”.

A atuação dos “Tais Quais” no Fundão ficará na memória dos espetadores como um dos mais divertidos e concorridos concertos de um passado recente. Daqui a uns anos ouvir-se-á falar da noite em que o covilhanense João Gil partilhou, a partir do palco instalado nas proximidades da antiga Casa do Bico (Estalagem da Neve), com a plateia a memória de conversas antigas partilhadas à mesa do convívio com dois homens cuja memória valoriza o passado de história, vivência e comunhão de vontades de António Paulouro e António Morão.


Um e outro já não estão entre nós. Mas os que lhe foram próximos, e seus admiradores seguidores, haverão de estar contentes por saber que nesta geografia, às vezes esquecida e tão pródiga a desvalorizar os nossos, ainda há quem se lembre das vozes discordantes e portadoras de um assertivo ideal de liberdade de pensamento. 

#Foto de Miguel Proença 

quarta-feira, agosto 09, 2017

Subir à Estrela num dia de Verão

O calor de uma quinta-feira de agosto convoca quem está de férias a refrescar-se nas paradisíacas praias fluviais da Beira Interior, a ficar na piscina lá do burgo ou na do hotel mais próximo. Naquele 3 de agosto o desafio imposto pela curiosidade passou por subir ao alto da Torre em plena serra da Estrela.
Às nove da matina em ponto a “tropa” saiu de casa entrou no carro da condutora insegura mas audaz e fez-se ao caminho. 
Ainda na cidade do Fundão deu-se conta da forte presença de emigrantes que por estas semanas acrescentam movimento e valor à cidade e economia local.
Embora muitos comerciantes digam que os emigrantes que passam o ano na Europa já não vêm tão abonados como antigamente e também já não deixem na banca portuguesa as divisas de outrora, a verdade é que numa cidade de pequena dimensão como o Fundão a presença dos emigrantes faz toda a diferença.
Não sabemos se vêm os tais cerca de 25 mil de que falava há uns dias o autarca local, quando aludia à forte componente de emigração que caracteriza o concelho do Fundão, mas sabemos que o pico do Verão coincide com mais gente, por exemplo, no mercado da segunda-feira.
E este é, pois, um tempo em que as nossas aldeias e vilas reganham vida e até atingem um certo patamar cosmopolita. É também essa realidade que o viajante encontra quando, como comecei por contar, se propõe subir à Estrela num dia de Verão.
Se nas Penhas da Saúde o café, momento de caminhada e reencontro com a memória foi quase solitário, dada a ausência de pessoas nas imediações do hotel "Serra da Estrela" ou do Clube Nacional de Montanhismo, mais acima começamos a cruzar-nos com carros de matrícula estrangeira.
Primeiro os espanhóis. Sim, o país vizinho continua a gostar do nosso sol e mar mas também se interessa pela montanha. Foi isso que constamos no belíssimo e requintado “Soadro do Zêzere” em Valhelhas onde almoçamos principescamente e por um preço razoável.
Mas a Estrela também é ponto de encontro de emigrantes. Sobretudo os franceses e suíços. Lá os encontramos no alto da serra da serra da Estrela! 
Ora para a foto de família e recordações de outras visitas ora para o reencontro com os produtos tracionais da região.
Alias quem entra no Centro Comercial da Torre é rapidamente convocado a provar a deliciosa regueifa, o tradicional queijo da serra ou os paios, presuntos e lombos embalados em vácuo.
Nesta altura do ano o movimento de turistas na Estrela cai para menos de metade. Ainda não existem programas nem atrativos para a serra fora do tempo da neve e talvez isso explique o decréscimo de turistas no cartaz chapéu do turismo na região.

Nada que desanime quem tem no Centro Comercial da Torre a rotina de uma vida inteira. Mas nem só de produtos típicos se faz a oferta comercial. Hoje em dia é bastante comum encontrar utilidades como atoalhados e panos com dizeres alusivos a serra. Foram esses recuerdos que muitos espanhóis terão levado para pais de origem. Souvenirs que muito ajudam a manter o mercado da saudade. Mas também há os "borregos" que no Inverno aquecem os pés, os casacos ou samarras e ainda os gorros que podem ter dizeres alusivos à serra ou ao clube de futebol de maior expressão dentro e fora de Portugal. É no mercado da saudade que muitas vezes se cruzam portugueses oriundos de várias paragens e que no Verão regressam sempre às origens. 
Observam então a geografia de berço, renovam abraços e estimulam os afetos "adormecidos" no Verão transacto. É também nesta altura do ano que muitos dos nossos regressam aos locais paradisíacos dos territórios para retemperar energias e embebedar-se na beleza das paisagens verdejantes e na frescura das águas límpidas do rio ou da ribeira mais próxima.
Naquela manhã de agosto o viajante fez-se ao Covão d`Ametade e foi com um sentimento de indignação que se deu conta do abandono a que está votado um lugar que tantas vezes escolheu para convívios e lazer pois sempre o encontrou limpo e verdejante. 

E permanece verde. Mas não está limpo e os equipamentos votados ao abandono estão destruídos, danificados, sujos. Irreconhecíveis! Será este um retrato apenas do vandalismo ou as mazelas resultam da falta de vigilância e do desapego dos senhores do Parque Natural da Serra da Estrela? Pensar que o Covão d`Ametade foi classificado como Local de Interesse Geológico! Mas alguém se interessa?

Fica o recado para quem o quiser interiorizar. E o mesmo é válido para os gestores do Centro Interpretativo da Serra da Estrela localizado no alto da Torre e permanentemente fechado.
Aberto estava, em Valhelas, o restaurante "Soadro do Zêzere" onde o proprietário nos recebeu com uma educação e elegância pouco regulares na receptividade a quem visita o coração da Estrela.



Valeu a pena "cair da cama" e fazer de um dia de Verão um passeio pelos trilhos da serra onde desta vez não houve disposição e força anímica para subir ao Cântaro Magro ou fazer escalada na Parede dos Fantasmas.
Também não me cruzei com o pastor que há cerca de vinte anos me contou todos os segredos associados ao pastoreio de cabras e ovelhas. 
Talvez o tivesse encontrado se o tivesse procurado nas imediações da casa da ASE- Amigos da Serra da Estrela onde outrora descobri sons e "tarântulas" e me aqueci à lareira da casa abrigo.  

Talvez....
Talvez a proteção e vigilância da floresta tivessem ajudado a prevenir os incêndios que há alguns anos devastaram o Vale Glaciar do Zêzere. 
Será o leitor capaz de imaginar a melancolia que nos invade a alma quando num regresso a Manteigas nos apercebemos da erosão dos solos e da destruição da riqueza da serra? 
Fica a pergunta. 

quarta-feira, abril 19, 2017

Canções com Memória

Diz o poema da canção que hoje ecoará no Meo Arena


"Quantas vezes me sinto perdido 

No meio da noite Com problemas e angústias Que só gente grande é que tem Me afagando os cabelos Você certamente diria Amanhã de manhã você vai se sair muito bem Quando eu era criança Podia chorar nos seus braços E ouvir tanta coisa bonita Na minha aflição Nos momentos alegres Sentado ao seu lado, eu sorria E, nas horas difíceis Podia apertar sua mão" (...)


O tema belissimamente interpretado por Roberto Carlos é umas das minhas canções de e para a vida. O Rei completa hoje 76 anos. Minha mãe teria completado 72 e meu pai teria no dia 10 de abril alcançado a bonita fronteira dos 98.



Que têm meus pais a ver com uma das mais nostálgicas canções de Roberto Carlos?



Tudo.



Aprendi a ouvir Roberto Carlos nos anos 80 do século XX com os meus pais. Na Gardunha não havia televisão e naquela época também não havia consolas. Eu também não tinha muitos brinquedos nem bonecas. Na tranquilidade (hoje recordo assim a serra da Gardunha) ou na pasmaceira dos dias passados na solidão de que mora na floresta, as horas eram passadas na companhia dos pais e da minha irmã três anos mais nova. 



Aos domingos à tarde, quando as temperaturas o permitiam, trazíamos o rádio para as escadas da casa e sintonizávamos a onde média da Rádio Altitude. Apesar de na aldeia as tardes de domingo serem propícias aos bailaricos no salão paroquial, eu permanecia na serra e ouvia os discos pedidos ( sim, naqueles anos a telefonia também dedicava discos e aproximava pessoas ou era remédio contra a solidão!) ao lado da mãe Patrocínia.



Levantávamos o volume do Rádio e mesmo que meus pais se entregassem à rega, à sacha ou às tarefas do campo, havia a certeza de que nenhum de nós perderia o programa emitido a partir da cidade mais alta.



Também havia momentos de pura empatia. Eu e a mãe chegávamos a cantarolar juntas. Às vezes também me sentava na perna direita de meu pai que guardava a esquerda para a mana Paula e fazia cavalinho connosco.



Ali ficávamos a contemplar a paisagem verde, às vezes já com tonalidades de verão e outono, e a receber do mimo incondicional dos progenitores.



"Lady Laura" é uma dessas canções intemporais que, além de um saudosismo profundamente melancólico, me faz recuar ao tempo em que sendo criança me fiz adulta e mulher precoce.  Interiorizava o significado de cada uma das quadras da canção interpretada pelo lendário musico que neste 19 de abril de 2017 regressa a Portugal para um concerto que há-de ser memorável.



Às vezes, ou muitas vezes, as canções devolvem-me a lembrança dos dias andados, dos caminhos cruzados com a Gardunha ou outras paragens bem mais planas mas igualmente pejadas de boas lembranças a ouvir as canções do Rei.


E aqui vos deixo outra

https://www.youtube.com/watch?v=54xxnkXqltw

E mais outra

https://www.youtube.com/watch?v=3fuzoSGTNOo

Por razões diferentes são canções com memória.





sexta-feira, março 24, 2017

Uma Ode à Casa do Barro

Bom Dia!
Não Basta Olhar.
É preciso falar!
As palavras ditas por uma septuagenária quebraram o longo silêncio no curto passeio do final da manhã primaveril no Telhado.
A viagem concretizada por via de uma visita de estudo à Casa do Barro tinha permitido perceber que nesta como noutras aldeias da Beira a vida faz-se devagar e na calmaria do calendário que à hora certa leva as pessoas para as empresas longe da terra do barro ou do berço do poeta Albano Martins.
Num povoado com cerca de 600 habitantes o ofício outrora dedicado à olaria é agora preenchido noutras paragens e geografias porventura menos poéticas.
Enquanto muitos saem de manhã para voltar ao por do sol preenchendo a jornada em busca do ganha pão na terra do barro, onde a linguagem poética vai além da "Torre das Palavras", permanecem os residentes com mais idade.
Uma espécie de Sol Nascente que transporta o transeunte para a esperança que olhar alcança no verde esperança que caracteriza os campos verdejantes e a perder de vista.
Enquanto o relógio avança e a senhora Maria arruma a casa e coloca a roupa da cama à janela, há um punhado de crianças de tenra idade que invade a pacata aldeia e semeia a alegria de viver. As ruas silenciosas que nos anos trinta do século XX foram calcorreadas pelo poeta das paisagens voltam a ter vida mesmo quando as crianças da escola primária, que resiste à desertificação humana, estão naquele instante em horário lectivo.

São dezenas de miúdos (as) acabados de chegar do Fundão que é cidade das cerejas e foi berço de outros poetas e homens que semearam as palavras que desde sempre inscreveram a terra de José da Cunha Taborda ou de José Alves Monteiro na paisagem literária e instruída da Cova da Beira.
É então que apetece comparar a energia contagiante da miudagem ao desabrochar das flores.
A correr e saltar, cheios de curiosidade vão ao encontro do barro e dos ofícios que há muitos anos foram sustento maior para as gentes do Telhado. Ali descobrem a importância da olaria numa casa temática que os ajuda a compreender a metodologia de trabalho, as peças e a roda do oleiro que chega a entusiasmar a educadora Amélia Nunes.
Portadora de um vasto leque de conhecimentos relacionados com oralidade, etnografia e tradições Amélia Nunes é como peixe dentro de água. Embora teime em recusar a publicação de tanta sabedoria popular é nela que as crianças de 4 e 5 anos se focam para, através dos sentidos, se apaixonarem pelas rotinas da olaria.
Amélia parece uma profissional de turismo e explica ao Rodrigo, ao Gonçalo ou à Maria o bê à bá da olaria e das utilidades criadas pelo labor dos oleiros cuja criatividade e sentido empreendedor transformou o barro em tigelas, potes, cântaros, gamelas e tachos ou até nas coelheiras.
Imagine o leitor a cara de estupefação da criançada quando ouviram Amélia contar-lhes que naquela peça poderiam habitar coelhinhos.

E depois vieram os Rostos da Memória, memorial dedicado aos muitos oleiros cujo labor de uma vida de dedicação permitiu gerar riqueza e o património imaterial às vezes plasmado nos livros e na linguagem poética que vai muito além do percurso literário de Albano Martins e que também convoca o visitante do Telhado a conhecer essa valiosa "Torre das Palavras" que é contígua à Casa do Barro onde as crianças do Fundão meteram as mãos no barro.
E diz o poeta :
"De barro somos, dizem os oráculos, solicitas vozes do crepúsculo ou das manhãs solenes, rituais (...)"

sexta-feira, janeiro 27, 2017

O exemplo da Liga dos Amigos do Tortosendo

No outro dia o meu programa de rádio saiu do estúdio da Rádio Cova da Beira e foi ao encontro de um conjunto de jovens e dirigentes que dão vida a uma das mais emblemáticas coletividades da vila do Tortosendo no concelho da Covilhã.

Foi o entusiasmo do recém-eleito presidente da Liga dos Amigos do Tortosendo, Eduardo Alves, que me fez ir à descoberta daquele espaço mágico, localizado bem no centro da vila operária, para perceber das intenções e projetos de futuro.

A história e as memórias de uma “família” que já reúne à volta de 800 membros é uma realidade que bastante orgulha Manuel Carrola, sócio fundador da organização que hoje é um pulmão de cultura.

A Liga dos Amigos do Tortosendo é-me bastante familiar por via do dinamismo de duas mulheres com quem tenho tido o privilégio de me cruzar neste percurso entre as notícias e a movida cultural da região. As professoras e amantes dos livros Merícia Passos e Adélia Mineiro.

É esse registo cultural que tão bem caracteriza a Liga dos Amigos do Tortosendo que continua a marcar o registo na simpática e acolhedora coletividade que até sabe descentralizar a ação e envolver os parceiros.
Basta lembrar o último Natal quando a filósofa e escritora Vanessa Martins escreveu o conto “O Frio do Menino Jesus” que além de ter sido ilustrado pelo artista Tó Pê teve a particularidade de chegar à mão das crianças da vila.

Uma iniciativa da Liga que foi apadrinhada pela Junta de Freguesia local, entidade que tudo fará para contribuir para o bem-estar e felicidade das 250 crianças do Tortosendo. E não é “coisa” pouca admite o autarca David Silva que no decurso do Porque Hoje é Domingo – o programa que passa aos domingos de manhã na telefonia, anunciou que haverá de convidar Vanessa a escrever a história do Tortosendo para crianças.

É fantástico este entusiasmo de quem sabe como a complementaridade e a partilha de recursos são hoje uma das regras base da sobrevivência dos povos e suas entidades e organizações tantas vezes habituadas a fazer muito com poucos recursos.
Boas-práticas adotadas pela Liga dos Amigos do Tortosendo que com a ajuda de outros parceiros públicos e privados conseguiu promover uma belíssima exposição de retratos do jovem pintor do Tortosendo Guilherme Ramos.

“Rostos”. Assim se chama a mostra que pode visitar num espaço cedido pela Gráfica do Tortosendo e na qual o também estudante de belas-artes dá expressão mágica a muitos dos exercícios das aulas.
Um encontro feliz com as artes na vila que ainda no último Verão brindou a comunidade regional com o Urban Art do Tortosendo que até homenageou o malogrado Zéca Afonso.

Símbolo de uma identidade que enriquecerá os próximos exemplares do Boletim Informativo da LAT que lá para setembro chegará à centésima edição. Nessa altura a publicação terá “um selo de qualidade”, promete David Silva que através da Junta de Freguesia local continuará a patrocinar atividades que muito enriquecem as comemorações dos 90 anos da elevação do Tortosendo à categoria de Vila.


Eugénio de Andrade o poeta maior

 Fui à Póvoa. À terra do poeta nascido há uma centena de anos. Encontrei memória falada, orgulho e expetativa quanto à importância de Póvoa ...