sexta-feira, março 24, 2017

Uma Ode à Casa do Barro

Bom Dia!
Não Basta Olhar.
É preciso falar!
As palavras ditas por uma septuagenária quebraram o longo silêncio no curto passeio do final da manhã primaveril no Telhado.
A viagem concretizada por via de uma visita de estudo à Casa do Barro tinha permitido perceber que nesta como noutras aldeias da Beira a vida faz-se devagar e na calmaria do calendário que à hora certa leva as pessoas para as empresas longe da terra do barro ou do berço do poeta Albano Martins.
Num povoado com cerca de 600 habitantes o ofício outrora dedicado à olaria é agora preenchido noutras paragens e geografias porventura menos poéticas.
Enquanto muitos saem de manhã para voltar ao por do sol preenchendo a jornada em busca do ganha pão na terra do barro, onde a linguagem poética vai além da "Torre das Palavras", permanecem os residentes com mais idade.
Uma espécie de Sol Nascente que transporta o transeunte para a esperança que olhar alcança no verde esperança que caracteriza os campos verdejantes e a perder de vista.
Enquanto o relógio avança e a senhora Maria arruma a casa e coloca a roupa da cama à janela, há um punhado de crianças de tenra idade que invade a pacata aldeia e semeia a alegria de viver. As ruas silenciosas que nos anos trinta do século XX foram calcorreadas pelo poeta das paisagens voltam a ter vida mesmo quando as crianças da escola primária, que resiste à desertificação humana, estão naquele instante em horário lectivo.

São dezenas de miúdos (as) acabados de chegar do Fundão que é cidade das cerejas e foi berço de outros poetas e homens que semearam as palavras que desde sempre inscreveram a terra de José da Cunha Taborda ou de José Alves Monteiro na paisagem literária e instruída da Cova da Beira.
É então que apetece comparar a energia contagiante da miudagem ao desabrochar das flores.
A correr e saltar, cheios de curiosidade vão ao encontro do barro e dos ofícios que há muitos anos foram sustento maior para as gentes do Telhado. Ali descobrem a importância da olaria numa casa temática que os ajuda a compreender a metodologia de trabalho, as peças e a roda do oleiro que chega a entusiasmar a educadora Amélia Nunes.
Portadora de um vasto leque de conhecimentos relacionados com oralidade, etnografia e tradições Amélia Nunes é como peixe dentro de água. Embora teime em recusar a publicação de tanta sabedoria popular é nela que as crianças de 4 e 5 anos se focam para, através dos sentidos, se apaixonarem pelas rotinas da olaria.
Amélia parece uma profissional de turismo e explica ao Rodrigo, ao Gonçalo ou à Maria o bê à bá da olaria e das utilidades criadas pelo labor dos oleiros cuja criatividade e sentido empreendedor transformou o barro em tigelas, potes, cântaros, gamelas e tachos ou até nas coelheiras.
Imagine o leitor a cara de estupefação da criançada quando ouviram Amélia contar-lhes que naquela peça poderiam habitar coelhinhos.

E depois vieram os Rostos da Memória, memorial dedicado aos muitos oleiros cujo labor de uma vida de dedicação permitiu gerar riqueza e o património imaterial às vezes plasmado nos livros e na linguagem poética que vai muito além do percurso literário de Albano Martins e que também convoca o visitante do Telhado a conhecer essa valiosa "Torre das Palavras" que é contígua à Casa do Barro onde as crianças do Fundão meteram as mãos no barro.
E diz o poeta :
"De barro somos, dizem os oráculos, solicitas vozes do crepúsculo ou das manhãs solenes, rituais (...)"

sexta-feira, janeiro 27, 2017

O exemplo da Liga dos Amigos do Tortosendo

No outro dia o meu programa de rádio saiu do estúdio da Rádio Cova da Beira e foi ao encontro de um conjunto de jovens e dirigentes que dão vida a uma das mais emblemáticas coletividades da vila do Tortosendo no concelho da Covilhã.

Foi o entusiasmo do recém-eleito presidente da Liga dos Amigos do Tortosendo, Eduardo Alves, que me fez ir à descoberta daquele espaço mágico, localizado bem no centro da vila operária, para perceber das intenções e projetos de futuro.

A história e as memórias de uma “família” que já reúne à volta de 800 membros é uma realidade que bastante orgulha Manuel Carrola, sócio fundador da organização que hoje é um pulmão de cultura.

A Liga dos Amigos do Tortosendo é-me bastante familiar por via do dinamismo de duas mulheres com quem tenho tido o privilégio de me cruzar neste percurso entre as notícias e a movida cultural da região. As professoras e amantes dos livros Merícia Passos e Adélia Mineiro.

É esse registo cultural que tão bem caracteriza a Liga dos Amigos do Tortosendo que continua a marcar o registo na simpática e acolhedora coletividade que até sabe descentralizar a ação e envolver os parceiros.
Basta lembrar o último Natal quando a filósofa e escritora Vanessa Martins escreveu o conto “O Frio do Menino Jesus” que além de ter sido ilustrado pelo artista Tó Pê teve a particularidade de chegar à mão das crianças da vila.

Uma iniciativa da Liga que foi apadrinhada pela Junta de Freguesia local, entidade que tudo fará para contribuir para o bem-estar e felicidade das 250 crianças do Tortosendo. E não é “coisa” pouca admite o autarca David Silva que no decurso do Porque Hoje é Domingo – o programa que passa aos domingos de manhã na telefonia, anunciou que haverá de convidar Vanessa a escrever a história do Tortosendo para crianças.

É fantástico este entusiasmo de quem sabe como a complementaridade e a partilha de recursos são hoje uma das regras base da sobrevivência dos povos e suas entidades e organizações tantas vezes habituadas a fazer muito com poucos recursos.
Boas-práticas adotadas pela Liga dos Amigos do Tortosendo que com a ajuda de outros parceiros públicos e privados conseguiu promover uma belíssima exposição de retratos do jovem pintor do Tortosendo Guilherme Ramos.

“Rostos”. Assim se chama a mostra que pode visitar num espaço cedido pela Gráfica do Tortosendo e na qual o também estudante de belas-artes dá expressão mágica a muitos dos exercícios das aulas.
Um encontro feliz com as artes na vila que ainda no último Verão brindou a comunidade regional com o Urban Art do Tortosendo que até homenageou o malogrado Zéca Afonso.

Símbolo de uma identidade que enriquecerá os próximos exemplares do Boletim Informativo da LAT que lá para setembro chegará à centésima edição. Nessa altura a publicação terá “um selo de qualidade”, promete David Silva que através da Junta de Freguesia local continuará a patrocinar atividades que muito enriquecem as comemorações dos 90 anos da elevação do Tortosendo à categoria de Vila.


sexta-feira, dezembro 09, 2016

Reencontro com Idanha

Naquele domingo de dezembro o sol envergonhado convocava-me para um passeio longe das rotinas e do quotidiano dos dias. Enquanto o grupo acompanhava a partida de futebol que opunha o Fundão ao Idanhense fiz-me ao caminho e andei a pé até ao centro de Idanha-a-Nova. A primeira paragem foi no Centro Cultural Raiano mas antes descobri como a geografia urbana da sede de concelho tinha crescido e sido acompanhada pela construção de novas infraestruturas de apoio à prática desportiva e de lazer.

A primeira surpresa ocorreu quando o jardim com equipamentos para a manutenção do corpo e da mente, instalado perto do novo hotel Estrela de Idanha, me pareceu pouco ou nada frequentado. Um excelente espaço de lazer que tantas pessoas gostariam de ter no seu bairro e na aldeia mas que em Idanha-a-Nova parece ter pouca procura.
Talvez o frio de dezembro não seja convidativo. Talvez as pessoas vão ao ginásio amiúde. Talvez não haja pessoas que gostem da prática de exercício físico.
Mas há pessoas? Se a área urbana cresceu é porque o número de famílias também aumentou.
Mas e então onde estão as pessoas?

Na tarde em que as avenidas de Idanha se apresentavam desertas e em que os bairros se caracterizavam pela calmaria de uma tarde sem movida até me foi difícil encontrar um espaço de cafetaria aberto. Mais depressa tropecei numa loja made in China. Pudera, estão em todo o lado e nas cidades mais populosas até vão aparecendo os China Shopping!

O périplo continuou e lá atrás soube bem observar que o Baroa, referência local gastronómica, continua de portas abertas e por certo a fazer as delícias de quem gosta de uma boa mesa.

Mas voltemos ao Centro Cultural Raiano, espaço de cultura inaugurado por Jorge Sampaio na década de 90 do século XX. Ponto de encontro com a cultura transfronteiriça. Porta de entrada para a experimentação e visitação de culturas oriundas dos dois lados da fronteira.
A sala que marcou um território e uma geração de políticos e fazedores de coisas foi financiada pelo Interreg II e só por isso já era o garante de que o espaço haveria de continuar a seu o laboratório e ideário de agentes e pessoas de Portugal e de Espanha.

Foi a pensar nessa memória e na história do quotidiano de outrora que entrei no Centro Cultural Raiano para observar exposições e dinâmicas à volta do território.
A escassez de pessoas que caracterizava a vila na tarde de domingo era também uma realidade num espaço cultural onde “há dias em que o número de visitantes é de um ou às vezes nem vem ninguém”, descreve a rececionista e guia da sala onde permanece uma exposição sobre agricultura.

Na sala de visitas da Raia não havia apenas a demonstração das artes e ofícios à volta da Campina mas também uma exposição fotográfica sobre o Património de Proença-a-Velha. É então que a profissional de serviço no Centro Cultural se lamenta quanto à falta de adesão dos locais às mostras que presentemente ali acontecem. “Talvez por já conhecerem as nossas tradições vêm pouco e não ligam, já estão habituadas”, diz.

Solícita e empenhada, a mesma profissional entra na conversa da visitante e admite que a frequência de público é hoje em dia “menos regular e numerosa”. “Tem dias!”, diz-nos quem nos relata a enchente do dia anterior pois “houve aqui um encontro de tunas” ou recorda o tempo em que o Inatel enviava frequentemente turistas para a capital da raia em Portugal.

No mesmo instante oferece-me um exemplar da ADUFE – Magazine Cultural editada pelo Município de Idanha. Uma publicação excelente e diferenciadora de tudo o que existe em matéria de agendas culturais municipais. 

A ADUFE transporta o leitor muito para além da oferta cultural. A publicação dirigida pela Divisão de Cultura do Município de Idanha-a-Nova é um roteiro sobre figuras marcantes da região (desta vez o destaque vai para Ribeiro Sanches ou para uma entrevista ao Ministro da Cultura Luís Filipe de Castro Mendes que é natural de Idanha), lugares e gente profundamente conhecedora da nossa geografia usos e costumes. Neste particular merece ênfase o relevo dado a Toulões ou à narrativa que destaca a verdadeira guardiã da história de Penha Garcia. 

A beleza das paisagens contrasta com o ceticismo dos dias em que nos damos conta de como a falta de gente pode “matar” uma terra, um destino, uma região. A desertificação é, aliás, uma realidade que marca os discursos de quem já na década de 90 – Joaquim Morão, autarca com obra feita e reconhecimento aqui e além-fronteiras é uma dessas vozes que nunca se cansa de colocar o dedo na ferida e ao mesmo tempo contagiar tantos e mais uns com esse apelo maior para que ninguém esqueça o Interior - defendia a necessidade de atrair investimentos à campina.

Mas os anos passaram, foram concretizadas obras, o ensino superior manteve-se, o município apostou no turismo e em projetos para a fixação de pessoas e aproveitamento dos campos mas nem assim se estanca a desertificação humana. Diante esta realidade cruel haverá Missão de Valorização do Interior que nos valha?


terça-feira, novembro 29, 2016

Gestos e Afetos

No outro dia fomos visitar o João. Não nos víamos há algum tempo e com o avanço da idade dos Martins ganhamos consciência de que temos de estar mais presentes.
Há um tempo em que a magia dos afetos nos convoca a conhecer pessoas. 
Muitas Pessoas! 
Convencemo-nos que temos muitos amigos e gerimos as nossas rotinas em função do convívio e partilha com esses tantos e muitos amigos.
Mas a vida muda, tornamo-nos mais maduros, perdemos alguma paciência e tornamo-nos mais seletivos. Às vezes selecionamos tanto que nos tornamos seres egoístas e pouco disponíveis para o outro.
Em boa verdade essa realidade e tendência a mantermo-nos na zona de conforto também resulta das desilusões e de observarmos a forma desapegada que caracteriza a relação entre pares. É como se estivéssemos dentro de quatro linhas e cada passo fosse uma espécie de jogada na defensiva! E essa autoproteção resulta, quase sempre, no início de um processo de isolamento que cria uma certa exclusão entre pares.
Mas não é o desalento quanto à natureza e afetuosidade das relações que aqui pretendo escrever.
Afinal o mote para esta narrativa foi a visita ao João Martins.




O João completou 90 Primaveras e era dos melhores e mais desinteressados amigos do meu Pai. Viu-me crescer, era visita regular a nossa casa na serra da Gardunha. Acompanhou o meu crescimento e conhecia o João Gabriel desde sempre. Todos os anos voltava à Gardunha e fazia-se acompanhar de um punhado de amigos. Durante um tempo o casal Martins e esses outros amigos passaram a ser nossos amigos também. Aquelas pessoas finas, bem-postas e muito educadas - como de forma simplista a minha saudosa mãe caracteriza os Martins e seus amigos - chegaram a acampar nas imediações da Casa Florestal de Castelo Novo!

Naqueles anos ainda não havia o conceito de Turismo na Natureza e a Gardunha também não dispunha de um Glamping Natura. Mas os Martins que deixavam a geografia do mar aviavam-se em terra para, comodamente, se instalarem na serra. Esse jardim natural cujo foco de maior beleza eram os cedros sob os quais existiam as mesas hexagonal e retangular com bancos de granito à volta e que a cada dia de Verão eram bastante procurados pelos turistas!

Mas voltando ao João Martins. Esse Amigo que me viu crescer e acompanhou o avanço da idade de meu pai, a perda de minha mãe, a minha ida para a escola, o primeiro emprego e o jornalismo. O casamento e o nascimento de meus filhos….
O João é hoje o mesmo homem charmoso e inteligente, brincalhão e amigo do coração, mas está perder energia. 
Há dias, nessa tal visita improvisada, que nasceu de um forte aperto no meu coração, encontrei-o menos alegre, para não escrever triste. Encontrei-o acabrunhado e desiludido com as consequências do avanço da idade.
Em boa verdade o João cabisbaixo que eu visitei este novembro é também um homem desiludido com a vida e com os amigos que ainda estão nesta vida. O João que há muitos anos visitava a Beira Baixa uma a duas vezes por ano para levar cerejas do Fundão, azeites, queijo, azeitonas e enchidos da Beira deixou de vir amiúde. Passou a vir mais espaçadamente. E ultimamente já nem vem!
Deixou de conduzir. Entregou-se á dependência! E embora continue a caminhar pela cidade de Lisboa, o homem que adora mar e peixe fresco de Setúbal há muito que se desfez da casa localizada mais perto desse horizonte de memórias povoadas da imensidão do mar que é como quem diz da plenitude da amizade e dessa grandiosidade, às vezes finita, dos afetos.

E é diante tamanha circunstância que o João e outros como ele se dão conta de como a amizade é afinal algo que pode ter os dias contados. E quando assim acontece, seja por via da finitude do Ser seja por outras razões que a realidade ainda não partilhou connosco, sentimo-nos mais sós. Foi essa realidade que pude observar na tranquila e melancólica manhã de Outono quando a cara-metade do João, de lágrima nos olhos, me segredava: Estamos sós. Cada vez mais só.
Aquele instante caiu-me no coração como flecha que deixa marca e domina-me o pensamento. Faz-me pensar noutros passos, pessoas e circunstâncias que de igual forma me magoam e fazem pensar nas muitas pessoas que ao longo de uma parte da vida se cruzaram comigo e subitamente perderam o meu contacto telefónico.

Preocupa-me este modo de ser e estar e na busca incessante por uma explicação que atenue a minha dúvida lembro um poema de Vinícius de Morais sobre a Amizade que evoca a singularidade do Ser.
Esse bicho, tantas vezes incompreendido!
E diz assim:
(…) Um Bicho igual a mim
Simples e humano
Sabendo-se mover
E comover
E a disfarçar com o meu (seu) próprio engano.

Seja como for o importante é constatarmos que ao longo da caminhada nos fomos cruzando com outros bichos, às vezes ingénuos, capazes de acreditar que o verbo pode dar lugar ao gesto.

Querido João e Mariette, nós -  os Gabriel de Matos - estamos sempre aqui para continuar a mimar-vos com um sorriso franco e farto ou com as couves da Tapada do Caldudo que desta vez ficaram no Fundão. 
“Foi pena que assim tenha acontecido, pois quando te vi entrar logo pensei em cozinhar as couves do Fundão”, disse o João que gosta de enviar flores e postais,  ainda escreve cartas e muitas vezes brinda a minha Leonor com o desenho, postal ou fotografia de um golfinho. 
Sim o João adora fotografia e ao longo da vida tirou-me muitas das fotografias que hoje enriquecem o baú da memória. 
Obrigada João! 

quarta-feira, novembro 16, 2016

Em Memória de um Guardião

Quando nos despedimos de um fiel depositário da memória sentimos nostalgia mas também insegurança e fragilidade.
Ontem partiu um guardião da memória e das boas práticas das Obras de Misericórdia. Um homem com um enorme sentido de responsabilidade e apego às causas e dores de uma das mais nobres instituições do Fundão.
Eurico Ramos, irmão da Misericórdia do Fundão desde novembro de 1971. 


Conheci-o há muitos anos. Poderei dizer que o percurso do irmão e dirigente da Santa Casa da Misericórdia do Fundão se cruzou com o da jornalista em mais de duas décadas. Eurico Ramos era um homem cordial e compreensivo.
Mesmo em tempo de "guerras" e dificuldades de maior nunca lhe ouvi uma resposta torta ou uma observação menos própria, narrativa tão comum quando o jornalista quer ir além do óbvio.
Quis o destino que um dia me cruzasse e privasse com o senhor Eurico Ramos numa outra condição. A de colaboradora da Instituição onde Eurico Ramos era dirigente.
Foi durante este tempo que me dei conta de como Eurico Ramos nos observava sem qualquer tipo de sobranceria. Não havia dia, enquanto a saúde lhe o permitiu, que não viesse à Misericórdia deixar um sorriso e demonstrar inequívocos sinais de empenho e dedicação à organização onde esteve ligado mais de quarenta anos.
Ouvi na Rádio uma declaração pública do Provedor da Santa Casa em que Jorge Gaspar manifestava sentido pesar pela perda de um dos mais empenhados e abnegados irmãos da Misericórdia do Fundão. Uma observação perfeita e bem ilustrativa sobre alguém que de forma zelosa cuidava da memória, das tradições e do culto da Santa Casa.  Uma realidade que pude constatar nos anos em que apreendi um bocadinho da experiência de Eurico Ramos na construção e caminhada de cada uma das edições da Semana Santa no Fundão. Um dos mais respeitosos e enriquecedores momentos anuais da vida da Santa Casa começava a ser preparado muitas semanas antes. Eurico Ramos ficava dias agarrado ao telefone e estabelecia contatos, construía pontes e envolvia a comunidade nas tradições Quaresmais. Também no âmbito do culto e das obrigações da Irmandade, plasmadas no livro do Compromissso da Santa Casa, Eurico Ramos recordava com entusiasmo os antepassados da visita dos irmãos aos doentes. Ajudava a identificar as campas dos irmãos falecidos e dava sempre o seu contributo no sentido de nos esclarecer, aos mais jovens colaboradores da Misericórdia, como deveríamos agarrar as situações e proteger a memória coletiva.
Depois, havia o Museu e uma quase ligação umbilical à geografia e história secular da instituição. Os cortejos de oferendas para a construção do hospital do Fundão. Tantas memórias! Tanto saber acumulado. Um dia escrevi que Eurico Ramos era o Guardador de Memórias. De facto a Santa Casa do Fundão e os seus colaboradores estão mais pobres com a partida do fiel depositário da história da Misericórdia. 





quarta-feira, setembro 28, 2016

Guardiões do Pintor

Os Traços de união do pintor das paisagens da Gardunha e da Raia também conhecido como pintor doa afectos fizeram-se ouvir numa tertúlia à volta da vida e obra de Barata Moura.


Foi há dias numa sessão integrada nas Jornadas Europeias do Património que também aconteceram no Fundão, um dos territórios da geografia de afectos do pintor falecido em dezembro de 2011. Meses depois de uma comunidade inteira ter festejado o centenário do artista que sempre engrandeceu os Bombeiros Voluntários do Fundão e todas as organizações e pessoas que no percurso de homem bom se cruzaram com o artista.

Barata Moura costumava ficar com os olhos rasos de água e às vezes quando falava do seu Fundão o olhar também se iluminava. 

Quase cinco anos depois do desaparecimento do pintor das paisagens e pelourinhos da Beira Baixa, o Museu Arqueológico Municipal do Fundão  juntou alguns amigos e conhecedores da obra que é uma espécie de puzzle ou traço de união entre territórios da Beira Baixa, região que muito enriquece as muitas dezenas de quadros espalhados por aldeias e cidades da região.

São essas obras que daqui a algum tempo poderão ficar reunidas num espaço museológico que Castelo Novo reclama e que, a fazer fé nas intenções e promessas autárquicas, será uma realidade.

Na mesa-redonda dedicada a Barata Moura merece especial ênfase a intervenção de Silva Amaro, o pintor cujo ofício descobriu inspirando-se no “Mestre Barata Moura”. "Não escondo que Barata Moura foi determinante na minha carreira de pintor. Os meus quadros pretendem homenagear e respeitar a memória de um homem bastante generoso. Um homem de palavra. Coisa rara nos tempos que correm", disse Silva Amaro.


domingo, setembro 25, 2016

Encontro com D.Dinis

As "Muralhas com História" da aldeia histórica de Sortelha no concelho do Sabugal receberam por estes dias uma centena de figurantes que, com um verdadeiro espírito trovadoresco, permitiram aos visitantes recuar aos séculos XIII e XIV.
Aconteceu na edição VI da Feira Medieval organizada pelo município local e cujo mote foi exactamente a história que se esconde na muralhada e bela Sortelha.
E foi uma feira bastante rica em cenários e encenação e cujos figurantes, decoração das casas e tascas temáticas nos transportaram para as vivências da época.
Entrar na aldeia muralhada e darmos-nos conta da explosão de vida e animação sem esquecer Dom Dinis, Rei Trovador e Lavrador é mais que uma viagem à já de si ímpar e imponente Sortelha. 

Há festas e festas e por estas bandas não faltam municípios a recorrer à criatividade da vizinhança para se lançarem em hipotéticas inovações que mais cedo ou mais tarde se esgotam ou passam a ser ponto de encontro para comes e bebes ou discotecas ao ar livre.
 Saibamos então, pelo menos,  tirar partido da essência e beber todo o processo criativo. Uma vez apreendida a metodologia de trabalho  tornar-se-à mais fácil fazer mais e melhor.
E em Sortelha faz-se bem! 

É salutar quando o passeio  nos garante que demos por bem empregue as horas passadas no contacto com locais e transeuntes. Gente de todo o lado, espanhóis também, satisfeita com a as recriações históricas,  mercado da época, tabernas, animação, torneios a cavalo, demonstrações de artes e ofícios. 
A concretização de um acampamento militar, os jogos medievais e os espetáculos de qualidade como os Galandum Galundaina ,https://www.youtube.com/watch?v=O8HQb8FAWQM, são bem demonstrativos de como havendo estratégia e inovação se torna mais fácil recriar com êxito.

Foi bonita a festa pá!

Eugénio de Andrade o poeta maior

 Fui à Póvoa. À terra do poeta nascido há uma centena de anos. Encontrei memória falada, orgulho e expetativa quanto à importância de Póvoa ...