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quinta-feira, maio 05, 2022

A Associação que é a sala de visitas de Castelo Novo

 

Ponto de encontro entre residentes e turistas, a coletividade, localizada na zona central da freguesia, é ponto de paragem obrigatória para quem quer sentir o pulsar da Aldeia Histórica. Ali pratica-se a arte de bem receber.


Fundada em 1998, a Associação Sociocultural de Castelo Novo (ASCCN) é liderada por duas sexagenárias. As irmãs Laurinda e Fernanda Duarte assumiram os destinos da organização social e não se furtam a esforços para agradar a quem visita Castelo Novo e recorre à coletividade para tomar um café, chá ou até solicitar disponibilidade para ali realizarem refeições de grupo.



Com a preciosa ajuda de outros dirigentes, radicados fora de Castelo Novo mas sempre disponíveis para arregaçar as mangas, desde que estejam na aldeia, as diligentes carolas da ASCCN facilmente granjeiam a ajuda de outras sócias e amigas da coletividade com vista à realização de convívio para associados ou garantindo acolhimento básico a grupos de turistas que solicitem a sede da Associação para ali poderem deixarem o farnel, degustarem a merenda e tomarem uma bebida quente.

Foi o que aconteceu no fim-de-semana do 25 de Abril quando um grupo de Alverca, através de um telefonema, garantiu que a ASSCN poderia disponibilizar o salão para o almoço partilhado. “Ficaram encantados com o acolhimento e decoração típica do espaço onde quiseram fotografar-se”, salientam as dirigentes associativas que nesses dias não tiveram mãos a medir com tanta afluência de turistas e naturais da freguesia. 

A ASCCN é o “único espaço com vida” na Aldeia, confirma ao Jornal do Fundão Laurinda Duarte que faz gala em não deixar fechar as portas da coletividade fundada pelo marido, Raúl Augusto Pinto Rodrigues. “Todas as pessoas desejam longevidade” a uma organização que desde sempre dinamizou a localidade através do acolhimento de tertúlias, iniciativas desportivas, eventos solidários, visitas de estudo à localidade  ou até aulas de ginástica que chegaram a quebrar o sedentarismo das pessoas idosas maioritariamente residentes na localidade.

Além dos carolas dirigentes, também alguns associados e amigos da agremiação se disponibilizam para ajudar a concretizar as atividades programadas. Na véspera do 25 de Abril, o voluntariado ganhou outro sabor na degustação de um almoço convívio que juntou 70 participantes entre sócios residentes e de fora de Castelo Novo que a reforma devolveu à freguesia.



É pois, na ASCCN que a idade maior e a pouca juventude da freguesia confraternizam num ritual que enobrece a localidade e orgulha quem está ao leme da Associação que em 2023 completará as Bodas de Prata. Ali, nos domingos à tardinha, é certa a confluência dos locais e novos residentes, mesmo se oriundos de outras nacionalidades, que elegeram Castelo Novo como último refúgio de uma vida inteira dedicada ao trabalho nos países de origem. É vê-los de copo de cerveja na mão, confraternizando com a comunidade local, soltando gargalhadas e simpatia que fica na memória de quem ali ocupa o tempo livre.

É a pensar nos resistentes e novos residentes de uma freguesia marcada pelo êxodo rural que a família da ASCCN dedicada muitas horas do fim-de-semana à associação. À beira de celebrar 25 anos de existência é quase certo que a data não passará em branco. Laurinda Duarte diz-se entusiasmada com a possibilidade de realizarem uma celebração à altura da jovem mas relevante força viva de Castelo Novo.

“Com a bênção do Senhor de Misericórdia e a entrega dos associados” nada será deixado ao acaso, “nem que tenha de investir do meu bolso”, atira a sorridente presidente ao lado da irmã Fernanda, na pausa pós almoço de celebração da Liberdade e da Democracia, no pátio exterior ao edifício onde, naquele domingo, ouve comes e bebes, concertina, alegria e reencontros com pessoas naturais de Castelo Novo que nas épocas festivas ou fins-de-semana alargados regressam à terra Natal e não falham uma ida à Associação Sociocultural de Castelo Novo.

Ali onde a vida acontece !



Originalmente publicado no Jornal do Fundão de 05 de maio 2022 

sexta-feira, junho 01, 2018

Cem Anos e uma Vida Feliz


Apresento-vos a centenária Maria de Lourdes Videira. Nasceu na cidade mais alta, veio para o Fundão ainda bebé e completa no dia 3 de junho 100 anos. Uma centena de anos de uma vida feliz. Contou-me no dia em que me recebeu em sua casa, no centro da cidade do Fundão, para gravarmos a conversa que passará na Rádio Cova da Beira, no programa “Porque Hoje é Domingo” exatamente à mesma hora em que na igreja matriz do Fundão decorrerá a eucaristia que assinalará o centenário de Lurdinhas Paulouro.



“Lurdinhas” pela dedicação que familiares e amigos têm para com a viúva de Armando Paulouro, o militar com que Maria de Lourdes Videira se casou depois de 26 anos de namoro à distância. “O meu marido passou muitos anos nos Açores e umas vezes queria casar, outras nem tanto. Escrevia-me muitas cartas de amor, mais do que eu!”. Descreve Lourdes Videira que embora não tenha adotado o nome da família Paulouro, é conhecida de todos os fundanenses como Lourdes Paulouro.

Na conversa divertida e intimista na sala de estar de um apartamento na rua Vasco da Gama, Lourdes Videira confessa-nos que gostaria de ter sido atriz. “Eu quando via o palco, corria para lá e só me imaginava ali a demonstrar o que eu gostava de fazer. Mas eu tinha uma vida muito presa. Não gostava de deixar os meus pais sozinhos e também não tive grandes oportunidades de estudar”, revela-nos ainda quem abriu no Fundão o primeiro colégio privado para as crianças. No entanto, o mesmo deixou de existir quando chegaram ao Fundão as Irmãs Franciscanas que criaram na Misericórdia um outro colégio que praticava “preços mais baixos” e lhe acabou com o projeto, descreve.

Além da educação infantil baseada na pedagogia de João de Deus Ramos *, Lourdes Paulouro desenvolveu, até aos 70 anos, um percurso profissional em boa parte foi dedicado ao combate à tuberculose. “Quando as Freiras me acabaram com o colégio, havia muitas famílias com tuberculose e Monsenhor Santos Carreto**, convidou-me para trabalhar no Dispensário de Tuberculose”. “Ajudei muitas famílias. Nos anos cinquenta ia às barracas dos ciganos dar injeções e fazer inquéritos para avaliar a evolução do surto da doença nas Minas da Panasqueira e na Covilhã”, explicou quem também exerceu funções de assistente social e reportava “diretamente ao diretor geral de saúde”.

Entusiasmada com as memórias de uma vida sempre “bastante ativa” a minha entrevistada orgulha-se de ter tido “a melhor nota – 16 valores – do seu ano no bacharelato de ação social”. Ao mesmo tempo lamenta não ter podido inscrever-se na licenciatura por “questões económicas”.

É única viva das três filhas do casal Emília Castro e Silva e João Videira. Com o sorriso contagiante que todoa a gente lhe reconhece, Maria de Lourdes conta ainda que o seu pai, “enquanto militar foi o único português que deu um duplo salto numa cerimónia oficial para a Rainha Dona Amélia”.  

O percurso de vida da viúva de Armando Paulouro, que durante vários mandatos foi secretário de sucessivas mesas administrativas da Santa Casa da Misericórdia do Fundão, cruza-se com a vida moderna da Misericórdia e do Hospital do Fundão onde chegou a trabalhar quando o serviço local de Luta Contra a Tuberculose passou para a alçada do Hospital local.

Uma vida de bem-fazer que cedo começou a desenhar-se pois aos doze anos, “quando ainda estudava num colégio na Guarda, um Missionário que foi visitar-nos perguntou se alguém se voluntariava para o acompanhar em África. Coloquei-me em cima de uma cadeira e ofereci-me para ir, mas era uma criança”, esclarece.

Diante a atenção da sobrinha Ana Emília Junqueiro que assiste à conversa, Maria de Lourdes socorre-se da memória fotográfica das muitas vivências e lugares emblemáticos do seu Fundão: O cinema Gardunha, o colégio de Santo António (onde conheceu o amor da sua vida) ou o Casino Fundanense dos bailes e outros encontros cujas lembranças vivenciadas povoam a conversa que durou mais de duas horas.

Já no final da gravação da entrevista sugeriu que a sobrinha me ofertasse um exemplar da revista satírica “O Mundo Ri” que durante anos foi desenvolvida por Armando Paulouro, José Vilhena e Simões Nunes. A publicação cujo número 103, datado de novembro de 1960, está agora na minha biblioteca custava 4$00 escudos.  



Certamente que a revista que perturbava a PIDE continuará a fazer parte das leituras de quem gosta imenso de ler. Camões está entre os clássicos mas hoje em dia lê  “livros mais leves” – terminou agora a leitura de “Fellini na Praça Velha”, da autoria de seu sobrinho Fernando Paulouro Neves.

O dia de Maria de Lourdes começa de manhã com as rotinas normais de quem gosta de vestir “toaletes que me fiquem e façam sentir bem”. “Vou sempre almoçar fora de casa e todos os dias tomo chá ou café com as minhas amigas. Não gosto de estar em casa”, confirma.

Autónoma e saudável, “só vai ao médico quando é obrigada”, escreve e lê sem precisar de óculos. Não sabe o que são diabetes, colesterol elevado ou tensão arterial irregular e diz-nos que o segredo é “estar sempre bem”.

E ficará ainda melhor quando este domingo presenciar na festa surpresa do centenário de nascimento um punhado de amigos, sobrinhos, sobrinhos netos e alguns bisnetos.

Será um momento inesquecível. Como inesquecível foi o pedaço da tarde de dia 31 de maio de 2018, o dia da gravação de uma conversa que reforça a ideia de bondade, pluralidade e modernidade da senhora Maria de Lourdes Videira.

*João de Deus Ramos era filho do pedagogo e poeta João de Deus e de D. Guilhermina Battaglia Ramos. João de Deus Ramos é  autor, entre outras, das seguintes obras sobre pedagogia: Reforma da Instrução Primária, 1911; A Reforma do Ensino Normal, 1912; O Estado Mestre Escola e a Necessidade das Escolas Primárias Superiores, 1924; A Criança em Portugal antes da Educação Infantil, 1940 – in Wikipédia
** Monsenhor Santos Carreto foi Sacerdote e Reitor do Seminário do Fundão

Eugénio de Andrade o poeta maior

 Fui à Póvoa. À terra do poeta nascido há uma centena de anos. Encontrei memória falada, orgulho e expetativa quanto à importância de Póvoa ...