quarta-feira, julho 22, 2020

“Onde houver uma pessoa tem de haver luz e esperança”



Fonte de vida das nossas aldeias e lugares, estancam por breves instantes o despovoamento. Graças ao esforço e dedicação de inúmeros carolas que fazendo dos clubes e associações uma segunda casa e ali promovem eventos que vão dando vida às sedes e ringues desportivos construídos nos anos de ouro dos fundos comunitários. É verdade que muitas dessas infraestruturas se encontram às moscas e estariam mesmo votadas ao abandono não fosse o caso de existirem aficionados do associativismo que ao fim de semana ou à hora do café, antes da missa ou em dias de futebol metem a chave na fechadura e abrem as coletividades onde se juntam as poucas pessoas que ainda residem nas aldeias do Interior. Felizmente vai havendo associações que agregam centenas de jovens, adultos e idos à volta das atividades que promovem.

O Clube de Amigos da Panasqueira, freguesia de São Jorge da Beira, é um desses pontos de encontro para a hora da bica. Tiago Silva é o rosto da esperança e do desalento. “As pessoas desinteressam-se pelas coletividades, o despovoamento é cada vez mais acentuado, somos sempre os mesmos mas nem que seja só por uma pessoa, continuamos a abrir o clube”, desabafa ao Jornal do Fundão o dirigente nascido em 1977. Saudosista dos anos de ouro da vida nas Minas da Panasqueira, quando os locais povoavam o Clube de Amigos da Panasqueira e também passavam muito tempo no Clube Recreativo da Barroca Grande. Tiago Silva ouvia contar às pessoas mais antigas que chegou a haver cinema num outro edifício agora degradado. Na Panasqueira onde residem agora cerca de meia centena de pessoas, Tiago Silva continua a sonhar com a recuperação do imóvel onde “poderíamos fazer um anfiteatro para as atividades que no Verão realizamos ao ar livre aqui no Clube”. Ideias não faltam a quem resiste no Couto Mineiro e nos diz que “onde houver uma pessoa tem de haver luz e esperança”.



Prosseguimos viagem e chegamos ao Sport Club Estrela da Pousadinha coletividade que se localiza na encosta da Serra da Estrela, no bairro da Pousadinha, pertencendo à União de Freguesias Cantar-Galo e Vila do Carvalho. Foi fundado no dia 1 de Janeiro de 1977, quando dez moradores se juntaram com o intuito de formarem uma associação que visava o “engrandecimento da cultura e do desporto. A criação desta Associação surgiu da necessidade de os naturais do Bairro da Pousadinha estabelecerem laços de convívio com as gentes oriundas de outras freguesia, nomeadamente de Verdelhos, que iam à Covilhã trabalhar nos lanifícios e por ali se encontravam. O clube que chegou a funcionar no café Estrela passou depois a ter sede social e fama pela prática de snooker, pool e pingue-pongue. Procurado por pessoas de localidades e concelhos vizinhos o Pousadinha também tem realizado torneios de futebol e futsal, torneios de malha e matraquilhos e provas de BTT. “Há dois anos deixamos o BTT pois ficava dispendioso realizar provas que juntavam mais de cem praticantes de todo o pais não se pagavam só com os subsídios”, revelou ao JF o atual presidente da direção.



António Pereira vinca ainda a importância do atletismo que nos anos 80 tinha forte adesão. Conta-nos ainda do título de Campeão Nacional de Matraquilhos na 2ª divisão e dos êxitos da equipa de damas. “A única federada no distrito”, especifica. O dirigente revela ainda a urgência em colocar piso sintético e balneários condignos no polidesportivo onde “habitualmente uma centena de miúdos e jovens praticam futsal”. Vocacionado para a mocidade e seniores o Sport Clube da Pousadinha criou um Grupo de Cantares que “realiza vinte atuações por ano”. Atualmente esta coletividade atravessa uma fase positiva, movimentando semanalmente dezenas de pessoas e reunindo cerca de 300 associados dos 10 aos 90 anos.

Da Estrela para a Gardunha é um pulinho e na serra no concelho do Fundão há um local paradisíaco cuja esplanada é dinamizada pelo Grupo Cultural Recreativo e Desportivo de Alcongosta há três anos reativado por um grupo de naturais ou residentes na freguesia. Ana Rodrigues que lidera a assembleia geral não esconde o entusiasmo quanto à coletividade como “ponto de encontro” e “espaço agregador” de pessoas de todas as idades. A sede do Clube, localizada no mesmo edifício da Junta de Freguesia e Centro de Dia da localidade só abre ao fim-de-semana. É lugar de convívio inter geracional uma vez que algumas atividades fomentam o diálogo entre associados, filhos, avós e netos. Embora não desenvolvam atividades federadas, Ana Rodrigues recua aos anos 90 do século XX elencando os torneios de futebol de cinco e o atletismo como atividades marcantes no percurso da coletividade com 42 anos de existência.


A coletividade que já foi Clube Académico de Alcongosta deu continuidade à história desportiva da freguesia que nos anos 30 acolheu os primeiros jogos de futebol contra aldeias vizinhas. Nos anos 60, Alcongosta teve, aliás, uma equipa de futebol cuja identificação - "Estrelas Vermelhas"- fazia jus à terra da cereja.
Memória que a atual equipa diretiva gosta de perpetuar envolvendo-se na dinâmica de grupo. Pedro Nunes, Patrícia Fernandes, Telma Rolão, São Henriques ou André Reis estão entre os atuais dirigentes que em nome do convívio e vida na freguesia arregaçam as mangas para o que for preciso. Além da abertura da sede social e das iniciativas ao ar livre no bar junto à Casa Florestal de Alcongosta, organizam torneios e caminhadas. Não há muito tempo remodelaram a sede social “desde o pavimento à eletricidade”, a mão-de-obra foi dos dirigentes e sócios que no Verão ocuparam o tempo livre na exploração do bar na serra e na aplicação dessas verbas na melhoria da sede social. Que nunca lhes faltem as boas energias!

Originalmente publicado no Suplemento JF Comunidade do Jornal do Fundão de dia 16 julho 2020 



terça-feira, julho 14, 2020

Centenário Amália Rodrigues

O Fundão está na rota das comemorações do centenário do nascimento de Amália Rodrigues. Expoente máximo do fado, mulher amada ou rainha do fado, Amália nem sempre foi acarinhada pelo seu Fundão.  Isso mesmo confirmaram no programa «Porque Hoje é Domingo» da Rádio Cova da Beira os convidados da emissão de dia 12 de julho que quiseram partilhar comigo e com os seguidores do programa, que está no ar desde 2013, os convidados da mesa redonda radiofónica que antecede um conjunto de iniciativas concelhios a realizar no Fundão a partir do dia 23 de julho.



Estórias com gente dentro numa conversa com José Manuel Lopes Rodrigues (sobrinho de Amália Rodrigues), António Fernandes (escritor e cronista) José Filipe Gonçalves (primo de Amália) e Alcina Cerdeira (vereadora da cultura no Município do Fundão).  


Das comemorações à memória viva de Amália Rodrigues num registo informal e emotivo que podem ouvir neste link: 


Amália da Piedade Rebordão Rodrigues não passava despercebida, “atraia a rapaziada, toda a gente queria estar com ela, mulher de visão libertadora que também gostava de passear”, disseram os meus interlocutores na telefonia.

Trovadora triste e melancólica mas também alegre e feliz, assim a descreve o sobrinho José Manuel Lopes Rodrigues que se lembra da “tristeza e algum desgosto” que caracterizavam Amália sempre que recordava as passagens pelo Fundão.

Na então vila onde chegou a atuar no Casino, havia uma elite feminina desconfortável com a presença da embaixadora do fado. Realidades indesmentíveis dizem os vários registos consultados na imprensa de época e no Jornal do Fundão, semanário onde chegaram a ser publicadas intervenções públicas quanto aos atrasos na entrega da Medalha de Ouro do Fundão que deveria ter-lhe sido atribuída em vida.

“O Fundão não tem grande carinho por mim”, diria numa entrevista a fadista cuja condecoração do Município aprovada em 1989 - data dos 50 anos de carreira da artista - nunca recebeu. 
Mais tarde, depois de várias observações e criticas na imprensa, o executivo camarário remediou a falha e entregou ao sobrinho José Manuel Lopes Rodrigues a dita medalha.

De fato Amália foi mal amada no seu Fundão. Há até o registo factual da “atuação de Amália no Casino em 1946, na companhia do Grupo Cénico e a lápide que assinalava a presença da artista desapareceu”.
Oriunda de uma família modesta e numerosa, Amália Rodrigues que os admiradores caracterizavam como “rouxinol da senhora da Conceição” era afinal uma beirã que também deu concertos na Covilhã.
“Certa vez chegou a casa da minha mãe já de madrugada e apesar da hora tardia houve anedotas, bolos da Joaquina do forno e queijo curado” partilhou o primo José Filipe Gonçalves.

António Alves Fernandes, fã incondicional de Amália, recorda-se do pai “apaixonado” pelo percurso, dotes vocais e talento da fadista maior, encarada pela imprensa da especialidade como uma artista “com futuro risonho”, prognosticavam.

Memórias partilhadas no programa «Porque Hoje é Domingo» da Rádio Cova da Beira onde foi possível revistar a ida de Amália à Santa Luzia, com Varela Silva e a irmão Celeste Rodrigues, entoando cânticos alusivos à padroeira da visão e num carro de bois bastante bem enfeitado, revelaram.

Uma conversa que antecipou a comemoração local do centenário de nascimento de Amália cujo programa prevê a edição pelo Jornal do Fundão de um livro com ilustrações do arquiteto Álvaro Siza Vieira e um mural de arte urbana assinado por Frederico Draw que se localiza nas imediações da Praça Amália Rodrigues.


Ao longo de um ano haverá, também no Fundão, um conjunto de iniciativas culturais como a estreia em dezembro de 2020 de um Musical assinado por Rita Ribeiro com figurinos de Carlos Gil (estilista do Fundão), um concerto com Mariza em agosto de 2021 ou a atuação de Lula Pena também no Fundão mas em outubro do próximo ano.
A programação está disponível aqui https://centenarioamaliarodrigues.pt/tag/mais-programas/

Eugénio de Andrade o poeta maior

 Fui à Póvoa. À terra do poeta nascido há uma centena de anos. Encontrei memória falada, orgulho e expetativa quanto à importância de Póvoa ...