Chegar aos 60 rodeada de amig@s.
Nada de surpreendente se a aniversariante é amiga de muitas pessoas.
Em várias geografias.
Cada uma de nós mora, à sua maneira, nas gavetas da Neves, da Nanda, da Fernanda, da moça da pastelaria Jardim.
Quase toda a gente conhece a Nanda ou a pastelaria da Nanda.
Pela simpatia e acolhimento. Pela forma como se envolve na vida da comunidade. Pela popularidade.
Fundamentalmente pela generosidade que caracteriza a Nanda.
Não tenho presente o ano em que nos conhecemos. Sei que, ainda menina e aprendiz de jornalista, tinha [e ainda tenho] na Nanda e na sua pastelaria um porto de abrigo para tudo o que fosse [seja] preciso.
Da Nanda e do seu saudoso pai recebi muitas vezes deliciosas tostas mistas ou generosas sandes que um confeccionada e o outro - a Nanda - levava ao segundo andar do prédio no Beco dos Borracheiros ou Rua 5 de Outubro onde durante anos se fez a Rádio Jornal do Fundão.
A Nanda fonte de informação. É das pessoas que mais conhece @s transeuntes da cidade e arredores.
A Nanda alerta. Uma espécie de provedora do cidadão comum com problemas como os nossos e dos quais subtraia informação tantas vezes importante na busca de notícias ou no cruzamento de fontes fidedignas de informação.
Ela e a pastelaria, negócio de família, onde me tenho cruzado com tantas das minhas pessoas ou protagonistas de outras realidades que povoam a minha própria existência.
A Nanda que recebia o telegrama do meu admirador secreto ou observava os namoricos da minha eterna juventude.
A mulher que tantas vezes foi ombro amigo e me secou as lágrimas no fatídico ano de 1996. E nos meses que antecedem a morte da minha amada mãe.
Deve ser por isso que ainda sei de cor o telefone da pastelaria Jardim.
É também por isso que aqui alinho estas breves palavras de gratidão à dedicação da Nanda.
Esta é uma narrativa de saudade dos tempos idos.
Uma janela para a memória dos dias claros pois a amizade entre as pessoas deve ser sempre transparente e límpida.
Parabéns querida Nanda. Parabéns pelos 60 !
Oxalá consigamos continuar por aqui, por aí, a celebrar a vida e cantar vivas à Amizade.
Como o fizemos neste dia 27-06-2020, ainda sob as regras de um estado de calamidade que já foi de emergência e nos obrigou a ficar confinadas à nossa casa e família chegada.
Memorizando: Chegaste aos 60 no ano da pandemia covid 19.
Brindemos à vida.
À saúde.
À tua saúde e das pessoas que mais gostas.
Abraço.
Fracções de memórias passadas. Tempos idos e diluídos na espuma dos dias. A actualidade desta Beira que é a nossa!
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sábado, junho 27, 2020
sábado, maio 23, 2020
Desconfinando
Registo para memória futura do rendez vous entre amigas, dois meses e meio após a declaração de pandemia por causa do Covid-19. Seguiu-se o Estado de Emergência e depois o de Calamidade.
Agora que estamos à beira de uma nova fase do desconfinamento não resistimos à tentação de afogar a saudade na gulosa sangria tinta que a nossa Nanda preparou para o lanche com produtos locais e como sinal da nossa resistência à maior ameaça recente da humanidade.
Cansadas deste novo normal que para todas nós é uma espécie de degredo resolvemos desafiar a sorte e dizer presente. A vida é para ser vivida, mesmo se o inominável bicho não nos deixa abraçar, largar a máscara e retomar a regularidade de cada final de sexta-feira. Mas este reencontro que soube a esperança faz-nos antever resiliência e determinação na luta pela saúde de todas as pessoas.
Foi uma vez sem exemplo, mas quando esta guerra silenciosa terminar iremos celebrar a resistência num mega jantar com tudo aquilo a que temos direito.
quarta-feira, abril 08, 2020
Instantes do Meu Confinamento 5
Quando Esperar não é uma perda de
tempo…
Sempre fui
avessa ao nim, nem não nem sim, ao logo se vê, depois falamos, cada coisa a seu
tempo.
Não é que
seja uma mulher aparelhada, de sofisticada tecnologia, mais rápida que o vento. Mas sempre achei que não temos tempo a
perder.
Havia
situações em que repetidamente brincava com as notícias que davam conta da
constituição de mais uma comissão, grupo de trabalho, conselho consultivo …. Blá
blá blá.
Na verdade
sempre fui muito de mais vale uma má decisão do que uma não decisão.
Agora que
vivo há três semanas entre casa e o serviço sem direito a outras vidas dou
comigo a experienciar uma condição, até agora, pouco provável em mim.
A condição da
espera. Esperar que tudo acabe em bem. Que a minha família, amigos, conhecidos
e a organização onde passo os dias consigam ultrapassar esta pandemia sem
sobressaltos maiores.
Nesta já longa espera sinto que aprendi a viver sem as
jantaradas de sexta-feira, sem mais uns sapatos, uma carteira ou um vestido
novo.
De hoje para
amanhã, creio até que serei capaz de encontrar uma solução para as raízes dos
meus caracóis.
Uma solução que em nada tem a ver com o registo habitual do se a
cabeleira A não pode, a B deve ter uma aberta. Posso sempre recorrer à C.
E neste instante
ocorre-me a infância em Castelo Novo, entre a serra da Gardunha e a Aldeia e a
véspera de um casamento em Louriçal do Campo. Eu e a minha irmã Paula, meninas
de tenra idade, pais sem recursos e logística para irmos ao cabeleiro a
Alpedrinha. Vai daí o nosso pai improvisa e leva-nos ao barbeiro.
Saímos de lá com
uma tijela na cabeça. Literalmente!
Tudo tem
solução, diziam os meus pais do alto da experiência de quem sempre viveu com
pouco.
Com pouco e
sem pressa. A serra da Gardunha tinha, ainda tem, esse poder de ajudar-nos a
caminhar com vagar.
Vivamos então
esta pandemia com a ponderação e recomendações de quem sabe. Sejamos cautelosos
e capazes de esperar pelo fim deste tempo impeditivo de tantas situações que
afinal se afiguram não essenciais.
Essencial é continuarmos aqui para
contar a história.
Retemperando
energias com a memória dos dias bons. Reflexos da nossa existência
aparentemente comum mas com bases sólidas para hoje em dia sermos capazes de
esperar que a tempestade passe para relançarmos as sementes da amizade e do
amor entre pares.
Todo o amor verdadeiro se faz de uma longa
espera
quarta-feira, setembro 04, 2019
À Catarina e às pessoas que me fazem bem
A Catarina faz anos. Nunca me
tinha dado conta que uma das minhas amigas do coração nasceu um dia antes do
meu filho João. Ou talvez já me tenha ocorrido mas o pensamento terá
sido tão breve que não me fixei na curiosidade do calendário. Hoje fiquei a
pensar em como duas pessoas que me são tão próximas nasceram em anos diferentes
mas apenas com um dia de intervalo.
A Ana Catarina não é uma amiga de
infância e nem temos muitas vivências em comum. Direi que temos mais amig@s em
comum que experiências em conjunto. Mas as que temos são fartas. Generosas!
No outro dia jantámos e fiquei
com a sensação de que ainda tínhamos tanto para conversar! Sabem aquelas
pessoas de que gostamos profundamente mas vemos poucas vezes ? Quando se
juntam, conversam sem rede, riem muito, fazem planos. E no fim do encontro têm
vontade de puxar as orelhas ao relógio.
Não tenho presente o ano, muito
menos o dia, em que nos conhecemos. Sei que a amizade com uma amiga comum nos juntou.
E também sei, sinto, que conheço a Catarina desde sempre.
São tantos os pontos comuns! Os
sonhos, a visão poética do mundo, as boas energias. Fundamentalmente, a
generosidade em observar sem julgar. A entrega sem estarmos à espera de nada em
troca.
Há muitos anos, num aniversário
meu, numa noite gelada de janeiro estivémos juntas num bar do Fundão para
celebrar a vida. A ideia partiu da Marta que nos juntou à mesa das conversas e
fez desse serão um momento imensamente poderoso. Nesse dia, a Catarina
brindou-me com um adereço de moda que ainda hoje me acompanha. Guardo-o com
imenso carinho e sentido de gratidão.
De todas as vezes que o coloco
lembro-me sempre dessa noite. Lembro sempre os olhos azuis e o sorriso
contagiante da Ana Catarina. O colar com uma gaiola e um passarinho é um
símbolo de liberdade. É uma ode à criatividade e às energias boas. Àquel@s que
nos ajudam a voar.
Desses tempos longínquos guardo
ainda o desafio de participar num livro solidário de poesia. Escrever um poema
para uma obra cujas receitas reverteriam a favor da Entrelaços entusiasmou-me.
Não tanto pela possibilidade de as minhas palavras passarem a estar reunidas
num livro onde outros poetas de verdade iriam partilhar os seus dotes
literários. Mas por ser um desafio da Ana Catarina Pereira. Inicialmente receie
não estar à altura da exigência. Depois a ideia ganhou asas e saiu um poema de
amor. Daqueles que nos desnudam e permitem interpretações várias.
Não tenho aqui o poema para o
transcrever. Talvez seja mais seguro mantê-lo no baú das coisas escritas. As
pessoas mais curiosas poderão encontra-lo nesse livro solidário que ainda está
à venda, por exemplo, na Junta de Freguesia do Fundão.
Os livros sempre foram um ponto
forte na minha relação com a minha amiga aniversariante. Há dias enquanto lia o
contributo dela no livro “o que pode a arte?” editado pela Bordô –Grená foi
delicioso deixar-me envolver pelo poder da poesia na discussão de outra causa nossa: A
Igualdade de Género.
O texto “pela poesia é que vamos –
pela arte, resistimos” permitiu-me descobrir “leite e mel” de Rupi Kaur. Uma
extraordinária obra poética que nos fala de amores e desamores, abusos e
perdas. Ofensas encobertas à mulher. Foi ainda nesse artigo da minha amiga
apaixonada pelo cinema no feminino que também encontrei motivação para, de uma
vez por todas, ler com atenção a obra de Simone de Beauvoir. A escritora cuja
obra desconstrói mitos e estereótipos sobre género e sexo escreveu no livro “segundo
sexo” que “ninguém nasce mulher, torna-se mulher”.
Que dizer mais sobre uma amiga
inspiradora sempre disponível para enriquecer o meu percurso na comunicação? Neste
capítulo, recordo as entrevistas que me deu. A mais recente aconteceu em 2017
no meu “Porque Hoje é Domingo” na Rádio Cova da Beira e está aqui. https://www.mixcloud.com/dulcegabriel58/porque-hoje-%C3%A9-domingo-12-fevereiro-2017-rcb-ana-catarina-pereira/
Deleitem-se!
sexta-feira, julho 12, 2019
Pessoas que vão e pessoas que ficam
Quantos de nós olhamos para o caminho e nos damos conta da
quantidade de pessoas que deixámos para trás? Deixámos ou foram essas pessoas
que se afastaram de nós, dos nossos projetos e vivências?
As perguntas, bailam-nos no pensamento sempre que passamos
por uma provação, quando iniciámos um projeto ou concluímos outro. Vivemos o
momento com a energia e intensidade que o mesmo traduz mas observamos que
algumas vezes somos seres solitários nessa viagem e relação de compromisso com
as nossas coisas.
É então que a nossa memória, mesmo seletiva, nos conduz às
pessoas que fizeram o mesmo percurso ou nos alimentaram o trilho do paralelo da
vida.
Recordamos os dias mais perturbadores e os indubitavelmente felizes.
Recuperamos a memória inabalável da presença das nossas pessoas, naquele dia,
àquela hora. No momento mais improvável mas importante da nossa vida.
São essas minhas pessoas que pretendo “homenagear” com esta
ode à valorização d@s amig@s de sempre e para sempre.
Também há as pessoas que outrora foram antecâmara das nossas
preocupações e venturas. As tais pessoas que ficaram pelo caminho ou que
deixaram de nos dizer presente.
E que dizer das pessoas que um dia nos foram próximas,
morando nas nossas gavetas e agora nos observam de forma cordial?
Também há aquelas que fazem vista grossa. Aqui abro um
parêntese para dizer que perdoei mas não esqueci aqueles seres humanos que
passaram metade da vida a tecer-me loas e quando deixei de lhes dar palco
mudavam de passeio para não me cumprimentar.
Ensinamentos num percurso em que dou especial importância às
minhas pessoas. Aquelas que nunca me falham. Na alegria e na dor. Nos momentos
solenes ou nas mais ridículas situações capazes de me deixar desconfortável.
E quem são as minhas pessoas? E as que ficaram pelo caminho?
Pensem nisto. Eu sei quem são, todas essas pessoas. Todos
nós sabemos.
Agora façam esse exercício e obriguem-se a dedicar mais
tempo de vós às pessoas que nunca vos falharam. Essas pessoas são incondicionalmente
o nosso espelho.
Dêem-se. Digam presente. Surpreendam-nas.
Não fiquem à espera do último adeus para lhes dizerem que as
amam. Que têm saudades dos tempos em que a vida foi mais generosa e potenciou
mais encontros e partilha.
Digam-lhe hoje.
terça-feira, abril 30, 2019
Onde é que te gastas?
Onde é que
te gastas é uma pergunta bastante comum entre amig@s e significa que queremos
saber onde tens andado. O que tens feito. E que terão feito os meus leitores do
«De Castelo Novo para o Mundo»?
Por certo,
algumas pessoas terão dado pela minha ausência!
Tenho
trabalhado bastante. A missão de facilitar a comunicação absorve-me
sobremaneira. Depois há o compromisso semanal de realizar o meu «Porque Hoje é
Domingo» https://www.mixcloud.com/dulcegabriel58/ na Rádio Cova da Beira.
Ultimamente
dedico-me pouco à reportagem escrita e aos dizeres daqui…
Às palavras
que saem ao sabor da pena….
No outro
dia uma companheira de jornada disse-me que passou a escrever no seu blogue uma
vez por semana (www.nuncamaisesabado.net)
e também me explicou que se obriga a fazê-lo pelo menos uma vez por semana.
Está
explicada a razão do «Nunca mais é Sábado»! Vão lá ler.
Também
fiquei entusiasmada. De tal forma que abri esta janela para o mundo e observei
que não publico aqui nada desde dezembro de 2018.
Raios!
De então
para cá fiz tantos passeios, acompanhei concertos e outros eventos. Celebrei a
vida e a amizade. Também fui surpreendida pela visita de uma amiga de sempre e
fomos à neve.
Até parece
que estou longe desse cartaz maior que é a serra da Estrela!
“Dá Deus as
nozes a quem não tem dentes”, já diziam os antigos e têm muita razão. Afinal a
Estrela vê-se de todas as janelas da minha geografia e rotinas diárias!
Como diria
o diretor do Jornal do Fundão, “são os custos da interioridade”!
E destes a
gente gosta.
E que tenho
feito, além de comunicar?
Perdi um
amigo de sempre e não contive as lágrimas pela partida do João Martins. Um amigo
de família que pelo menos uma vez foi protagonista dos meus apontamentos. https://apaixonadapelavida.blogspot.com/2016/11/gestos-e-afetos.html
Neste tempo
passou um século sobre o nascimento do meu pai. Foi a dia 10 de abril. 100 anos
de nascimento de João Gabriel. Saudades tuas, meu pai de ouro. Ainda não
consegui escrever o livro sobre o último guarda-florestal de Castelo Novo. A
seu tempo, paizinho. A seu tempo!
Neste
entretanto completei mais um aniversário, reuni amig@s e familiares.
Retomei o
hábito antigo de ir, com regularidade, aos concertos que se fazem nas nossas
salas de espetáculos. Também tenho passeado.
Dos
concertos guardo a memórias das melhores companhias e a revisitação de grandes
canções. No outro dia fascinei-me com «The Gift», revivi a vida com
«Resistência» e descobri «Rubel».
https://youtu.be/A8ukTfUJUj8
https://youtu.be/A8ukTfUJUj8
Das canções
às traições vai alguma distância mas a música também significa valorizar o
património imaterial dos territórios. E na última Quaresma o meu Fundão
promoveu espetáculos de encher a alma.
Num dia de
abril fui à Capela de São Francisco, no Fundão, e assisti ao concerto Martyrio, protagonizado pelo coro
comunitário Ensemble Renovatio. Martyrio é o resultado do projeto de criação
LACE – Laboratórios de Criação Etnográfica para a Quadragésima, que este ano
teve por tema “coro como unidade de criação”. A tradição oral dos cânticos
quaresmais da Beira foi, então, interpretada por um coro comunitário – Ensemble
Renovatio – com direção artística de Susana Quaresma e Mariana Zenha.
Foi lindo!
Às
tantas senti-me em Castelo Novo a ouvir as pessoas da minha Aldeia a
interpretarem os martírios de lá.
Maravilhosa
foi a jornada em que a ida à Moagem para assistir a um documentário sobre
profissões em vias de extinção me dei conta de como valorizamos tão pouco as
nossas pessoas e as marcas que esses protagonistas deixam nos lugares outrora
mais povoados.
Foi lá que
conheci Rodolfo Nuno Anes Silveira. Licenciado
em Cinema e Comunicação Multimédia pela Universidade Lusófona, Rodolfo tem
raízes nos Três Povos (Fundão), vive em Munique (Alemanha) e está fazer doutorando
em Media Artes, na UBI- Universidade da Beira Interior.
Coordenador de estudos da Universidade de Televisão e Filmes de Munique (Hochschule für Fernsehen und Film - HFF), Rodolfo Silveira estava acompanhado de Daniel Lang da mesma universidade.
Coordenador de estudos da Universidade de Televisão e Filmes de Munique (Hochschule für Fernsehen und Film - HFF), Rodolfo Silveira estava acompanhado de Daniel Lang da mesma universidade.
Um e outro
promoveram na região uma recolha sobre ofícios em desuso e através da técnica “falar
com imagens” reuniram um conjunto de curtas-metragens que nos ajudaram a
redescobrir um ferreiro, um cesteiro,
uma tecedeira, um padeiro e um construtor de pífaros.
Artes e ofícios em vias
de extinção num documentário notável que será apresentado no Festival de Cinema
Documental de Munique (DOKFEST) no próximo mês de maio.
Fiquei orgulhosa daqueles jovens que assim nos
levaram até ao Jarmelo, Alcongosta, Janeiro de Cima, Silvares e Três Povos.
É bom quando os trilhos da vida nos cruzam com
pessoas assim.
Até outro instante!
segunda-feira, agosto 20, 2018
Os Amigos dos nossos filhos são nossos filhos também
Receber os amigos dos meus filhos, ter a casa cheia de pessoal,
observá-los e recordar tempos idos é das vivências mais interessantes da fase
adulta ou da meia-idade. Dei comigo a pensar nisto ao amanhecer deste domingo.
Horas depois de a Leonor ter recolhido aos seus aposentos acomodando no seu
quarto mais cinco pessoas.
Na véspera pedira à tia os colchões que eu e a Helena chegámos a
utilizar nas nossas aventuras de solteiras quando o montanhismo era hobby de
fim-de-semana. Além dos acolchoados colchões a diva - assim se caracteriza a
jovem Leonor quando tenta autorização do pai para mais um convívio fora de horas
ou uma renovada ida à cidade -, também cuidou de garantir reforços alimentares
e alguns sumos para a verdadeira ceia. Uma ceia antecedida de longos banhos de
piscina sob a lua de agosto.
Apesar da imaturidade, os nossos adolescentes são gente prevenida
e do género, quem vai para o mar avia-se em terra. Assim, de cada vez que a
Leonor, mas também o João, se prepara para promover mais um convívio,
certifica-se de que nada faltará aos convivas. Quantas vezes enquanto família
de acolhimento somos o táxi na “devolução” da miudagem aos pais! Fazemo-lo com
gosto e até alguma dedicação. Há um ditado que nos diz que quem meu filho cuida
minha alma adoça, logo temos por hábito cuidar dos amigos dos nossos filhos
como sendo nossos filhos, também!
A adolescência e juventude dos nossos filhos é o tempo em que
eles fazem novas amizades. O amigo do amigo que conheceram em registo educativo
ou na prática desportiva dentro das quatro linhas. Muitas dessas amizades cujo
crescimento se reforça nas experiências fora da escola ficam para a vida. É
como se os afetos até então focados nos primos e na cumplicidade de sangue
ganhassem novos contornos e semeassem um novo jardim de partilha.
É nesta altura que também nós, os adultos, iniciamos um novo
tempo de vivências e observação. Por um lado sentimos o orgulho de os nossos
filhos crescerem, tornando-se autónomos. Começam a afirmar-se pelos bons e
menos bons motivos. Sobressai-lhes o modo de ser e de pensar. Às vezes
condizentes com a nossa linha de orientação, noutras alturas o registo fica distante
da “doutrina” que lhe fomos incutindo. Criam-se então as barreiras ou
reforçam-se os laços de compreensão e cumplicidade entre gerações. Às vezes há
uma espécie de conflito entre pares. Mas tudo se resolve graças á tolerância de
pessoas e ao amor incondicional de pais.
É também nesta fase que perdemos o controlo dos passos delas e
deles. Aquela coisa da mãe galinha, a mania de “impingir” os filhos dos nossos
amigos aos nossos filhos e o “polícia” que há em nós ganha novos contornos.
Embora nos mantenhamos vigilantes já não impomos. Ou já não conseguimos impor.
Embora nos assalte uma catadupa de perguntas sobre quem é quem,
de onde vem e quem são os pais ou o que fazem, rapidamente deixamos cair o
questionário evitando o rótulo de coscuvilheiras ou metediças. Isto é válido,
sobretudo, para as mães. Os homens fazem menos filmes e confiam mais.
São estes estados de alma misturados com a alegria de receber os
amigos dos meus filhos que comprovam a capacidade do ser humano em se adaptar
às novas realidades. Aqui continuamos ao lado deles, e delas, para, mediante as
nossas possibilidades e forças, continuarmos a dedicar-nos aos filhos.
Os nossos descendentes dão mais vida à pacatez dos dias quando
nos enchem a casa de gente. É tão bom vê-los correr e saltar, mergulhar na
piscina ou acantonar na nossa geografia privativa!
No fundo, eles seguem os nossos passos e vivências. O tempo em
que as férias grandes eram passadas na aldeia dos nossos avós e os mergulhos
eram na ribeira ou na charca mais próxima. Depois havia as festas de Verão. E a
juventude reunia-se para o baile improvisado.
Os meus verões eram na serra da Gardunha e mais tarde na aldeia
de Castelo Novo. Na montanha as férias grandes eram sinónimo de guardar as
cabras e banhar-me nas águas gélidas do tanque localizado entre os cedros e a
casa florestal.
Quando havia turistas e crianças os meus dias ganhavam outra
alegria e às vezes cantávamos ao desafio. Já na aldeia, o Verão trazia as idas
à ribeira e as infindáveis conversas na rua com as pessoas da minha idade que
moravam em Lisboa e no Verão voltavam a Castelo Novo.
Memórias. E que memórias guardarão a Leonor, o João e o
Francisco deste tempo em que o nosso habitat recebe jovens e adolescentes de
outras latitudes?
sexta-feira, dezembro 29, 2017
Dos anos que não deixam saudades
Dizer
que 2017 é um ano que não vai deixar-me saudades é quase um lugar-comum. Efetivamente
os últimos doze meses, mas também os últimos anos, não me deixam saudades.
Ou
seja por a morte levar muitos amigos, conhecidos e até familiares. Ou por ter
cada vez maior consciência de que o mundo não é perfeito e que o país das
maravilhas é apenas um sonho de Alice. Mas também por sentir que a amizade e a
reciprocidade são cada vez mais substantivos femininos que não vão além do
léxico.
Este
é também um tempo em que a partilha e a promoção do convívio e harmonia entre
pares permanecem arredados da sociedade cada vez mais tecnológica e digital e
pouco dada à companhia e vivências entre pares.
Lamentos
à parte, o ano que agora termina deve servir para retirarmos lições de futuro e
reganharmos a força e motricidade suficientes para darmos a volta ao texto e
começar de novo.
Iniciar
um novo ano não significa apenas encerrar um capítulo. Significa ser capaz de
aprender com os erros ou ações menos apropriadas.
Significa
observar o passado, guardar as memórias boas e apagar todos os retratos e
imagens que nos entristecem e deixam mais céticos.
E
num ano vincadamente marcado pelo inferno dos incêndios florestais e pela
insensibilidade de quem gere o território, importa sermos capazes de enterrar a
fragilidade tornando-nos mais fortes e capazes reinventar modos de vida.
Reinventar
também é reclamar do atores políticos ações e boas práticas que vão além da
palmadinha solidária aos que no último Verão perderam familiares e amigos,
observaram a fúria do fogo e viram as suas vidas reduzidas a cinzas.
Que
o novo ano faça de todos nós pessoas audazes e resilientes. Que nunca nos doa a
voz para dizermos que os problemas de quem perdeu vidas, trabalho e viu comprometida
a economia de subsistência precisam de muito mais do que uma Unidade de Missão
e Valorização do Interior.
Criar
organismos, transportá-los para onde a dor é agora mais aguda, desenvolver
linhas programáticas de ação é fácil. Basta dar uso ao verbo.
Mas
o verbo não chega. É preciso ação.
Agir.
Mudar as políticas. Criar condições para desenvolver comunidades. Promover
ações que se traduzam em mecanismos reais e práticos com vista à criação de
emprego, à fixação de pessoas, ao desenvolvimento harmonioso dos territórios.
Se
assim for, certamente que daqui a um ano não estarei, não estaremos a
despedir-nos do ano velho com um sentimento de dor e impotência face à
realidade que caracterizou 2017.
O
mais negro dos anos levou-nos pessoas, floresta, produção agrícola e empresas. 2017
desnudou um Estado incapaz de evitar a morte de mais de uma centena de pessoas.
É,
pois, um ano que não deixa saudades.
segunda-feira, dezembro 04, 2017
A Inutilidade dos Dias Cinzentos
Na manhã do primeiro de
dezembro após o desafio de uma velha amiga e cúmplice nas andanças dos livros
fui ao encontro de uma tertúlia poética que todos os meses acontece num dos
mais aprazíveis lugares do “meu” Fundão.
O sol que por esta altura
anda baixo já havia aberto os braços por forma a receber-nos e a transmitir-nos
um pouco de calor. Em dezembro faz frio em todo o lado mas há momentos e
lugares em que tudo se transforma e as dinâmicas quase nos fazem crer na
inutilidade dos dias cinzentos.
Claro que a manhã radiosa
só poderia afastar todas e quaisquer nuvens que, mesmo longe do horizonte,
pudessem apoderar-se do ser.
E o ambiente que se vivia
naquele pedaço de manhã no Tertílias era tudo menos cinzento! Foi então que a
manhã introspetiva das palavras e o universo poético da editora Alma Azul me
tomaram o tempo e ajudaram naqueles momentos de meditação coletiva à volta da
poesia de Álvaro de Campos (heterónimo de Fernando Pessoa).
Na Tertúlia poética
dinamizada pela minha querida Elsa Ligeiro o bloguer Ricardo Reis abriu a
reflexão com a leitura de Aniversário.
E diz o poema:
No tempo em que festejavam o dia dos
meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer. (…)
Começamos então a partilhar ideias sobre o que pretendeu o poeta transmitir-nos. Mal nos descuidamos já opinávamos sobre as frustrações do ser ou a capacidade que nós, os mais adultos e experientes, vamos ganhando quanto à consciência dos efeitos desta vida povoada de timings e outras exigências que nos privam de caminhar ao sabor do nosso contentamento e dos prazeres da vida.
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer. (…)
Começamos então a partilhar ideias sobre o que pretendeu o poeta transmitir-nos. Mal nos descuidamos já opinávamos sobre as frustrações do ser ou a capacidade que nós, os mais adultos e experientes, vamos ganhando quanto à consciência dos efeitos desta vida povoada de timings e outras exigências que nos privam de caminhar ao sabor do nosso contentamento e dos prazeres da vida.
E eis que alguém traz à lembrança
a obra de António Ramos Rosa quando em “O Grito Claro” escreveu sobre o
funcionário cansado.
A noite trocou-me os sonhos
e as mãos
dispersou-me os amigos
tenho o coração confundido e a rua é estreita
estreita em cada passo
as casas engolem-nos
sumimo-nos,
estou num quarto só num quarto só
com os sonhos trocados
com toda a vida às avessas a arder num quarto só
Sou um funcionário apagado
um funcionário triste
a minha alma não acompanha a minha mão
Débito e Crédito Débito e Crédito
a minha alma não dança com os números tento escondê-la envergonhado
o chefe apanhou-me com o olho lírico na gaiola do quintal em frente
e debitou-me na minha conta de empregado
Sou um funcionário cansado dum dia exemplar
Porque não me sinto orgulhoso de ter cumprido o meu dever?
Porque me sinto irremediavelmente perdido no meu cansaço?
Soletro velhas palavras generosas
Flor rapariga amigo menino
irmão beijo namorada
mãe estrela música
São as palavras cruzadas do meu sonho
palavras soterradas na prisão da minha vida
isto todas as noites do mundo uma noite só comprida
num quarto só
dispersou-me os amigos
tenho o coração confundido e a rua é estreita
estreita em cada passo
as casas engolem-nos
sumimo-nos,
estou num quarto só num quarto só
com os sonhos trocados
com toda a vida às avessas a arder num quarto só
Sou um funcionário apagado
um funcionário triste
a minha alma não acompanha a minha mão
Débito e Crédito Débito e Crédito
a minha alma não dança com os números tento escondê-la envergonhado
o chefe apanhou-me com o olho lírico na gaiola do quintal em frente
e debitou-me na minha conta de empregado
Sou um funcionário cansado dum dia exemplar
Porque não me sinto orgulhoso de ter cumprido o meu dever?
Porque me sinto irremediavelmente perdido no meu cansaço?
Soletro velhas palavras generosas
Flor rapariga amigo menino
irmão beijo namorada
mãe estrela música
São as palavras cruzadas do meu sonho
palavras soterradas na prisão da minha vida
isto todas as noites do mundo uma noite só comprida
num quarto só
E ali permanecemos mais um
bocado na conversa à volta dos livros e questionámo-nos sobre o sucesso de
alguns escritores, às vezes produzidos pelo frenesim das redes sociais, e o
desalento de outros que escrevendo belíssimas narrativas continuam a não
conseguir sobreviver da literatura.
Também falámos da falta de
tempo para os nossos sonhos e para estarmos com quem deveríamos ou gostaríamos
de estar muitas e variadas vezes.
E agora que partilho com o
leitor o que me ficou daquela manhã de poesia no Tertílias, no Fundão,
lembro-me como gostaria de estar tantas e muitas mais vezes com os meus amigos
de coração.
Os tais que cabem no poema
de Alexandre O´Neill quando nos diz:
«Amigo» é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão! (…)
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão! (…)
E hoje, que faz sete anos que passei a acompanhar de forma mais próxima alguém que faz da amizade uma grande festa, estou cheia de vontade de voltar às tertúlias da Alma Azul e sugerir que depois da obra de Eugénio de Andrade, que revisitaremos em janeiro próximo, possamos partilhar textos e pretextos alusivos aos amigos.
Aqueles que nos ajudam a
afastarem os dias cinzentos.
terça-feira, novembro 28, 2017
Os Amigos Revelam-se
Num
dos textos do livro “O Pequeno Caminho das Grandes Perguntas”, o teólogo José
Tolentino Mendonça sugere ao leitor uma reflexão sobre os amigos de perto e de
longe. Os que estão sempre presentes e os distantes. Na atitude e no verbo.
Sugere o escritor e poeta que sejamos capazes de valorizar a afeição em vez da posse.
E mesmo quando o desprendimento é uma realidade, Tolentino Mendonça sugere que sejamos capazes de crer na essência da história e na origem dos laços.
E diz o texto:
“A etimologia da amizade reenvia-nos, assim, não para uma qualquer experiência casual, mas para a memória daquela afeição primeira que estrutura silenciosamente a existência. Por isso, na sua espantosa leveza, e sem alardes, a amizade dialoga com coisas muito fundas dentro de nós: faz-nos reviver o primeiro amor com que fomos (ou não fomos) amados; toca as nossas feridas, mesmo as que não conseguimos verbalizar; transmite-nos confiança para sermos o que somos e como somos; estimula-nos a progredir vida fora.
Nem todas as nossas amizades chegam a tomar consciência da extraordinária viagem interior que as mobiliza”. (…)
É
bem verdade que muitas vezes a amizade não vai além da verbalização de uma
palavra mas há sempre a esperança de que os verdadeiros amigos estejam sempre
ao nosso lado.
Haja
o que houver!
Porém há os dias em que a dúvida se instala e a alma veste-se de negro por sentir que uma e outra vezes, muitas vezes, a amizade deixa de traduzir-se em afeição e passa a ser um termo amplo e sem gesto. Sem o laço genuíno que vinha da primeira e silenciosa estrutura.
É então que nos olhamos ao espelho e nos perguntamos se o defeito é nosso. E se o nosso conceito de amizade e reciprocidade combina com a abordagem prosaica de uma convivência e cumplicidade sem estimulo e carregado de omissões e ingratidão.
Estes têm sido anos para desbravar caminhos, afastar pedras e vencer barreiras.
É também um período da minha vida em que tenho observado os meus amigos. Os de perto e de longe. Os presentes e os ausentes. Os desprendidos que são capazes de surpreender. Pela sua generosidade pela genuinidade de cada gesto!
Quem se lembra de nós, quem gosta de nós, promove. Age. Não omite. Dá continuidade ao registo.
Que me desculpe o José Tolentino Mendonça mas eu preciso de sentir que os meus amigos mesmo distantes estão próximos.
Estão sempre aqui. Chamam por mim. Perguntam como estou. Acompanham o meu percurso. Ouvem, leem e criticam. Dizem presente.
E
fundamentalmente não são ingratos.
terça-feira, novembro 29, 2016
Gestos e Afetos
No outro dia fomos visitar o João. Não nos víamos há algum tempo e
com o avanço da idade dos Martins ganhamos consciência de que temos de estar
mais presentes.
Há um tempo em que a magia dos afetos nos convoca a conhecer pessoas.
Muitas Pessoas!
Convencemo-nos que temos muitos amigos e gerimos as nossas rotinas em função do convívio e partilha com esses tantos e muitos amigos.
Muitas Pessoas!
Convencemo-nos que temos muitos amigos e gerimos as nossas rotinas em função do convívio e partilha com esses tantos e muitos amigos.
Mas a vida muda, tornamo-nos mais maduros, perdemos
alguma paciência e tornamo-nos mais seletivos. Às vezes selecionamos tanto que
nos tornamos seres egoístas e pouco disponíveis para o outro.
Em boa verdade essa realidade e tendência a mantermo-nos na zona
de conforto também resulta das desilusões e de observarmos a forma desapegada
que caracteriza a relação entre pares. É como se estivéssemos dentro de quatro
linhas e cada passo fosse uma espécie de jogada na defensiva! E essa autoproteção
resulta, quase sempre, no início de um processo de isolamento que cria uma
certa exclusão entre pares.
Mas não é o desalento quanto à natureza e afetuosidade das
relações que aqui pretendo escrever.
Afinal o mote para esta narrativa foi a visita ao João
Martins.
O João completou 90 Primaveras e era dos melhores e mais
desinteressados amigos do meu Pai. Viu-me crescer, era visita regular a
nossa casa na serra da Gardunha. Acompanhou o meu crescimento e conhecia o João
Gabriel desde sempre. Todos os anos voltava à Gardunha e fazia-se acompanhar de
um punhado de amigos. Durante um tempo o casal Martins e esses outros amigos
passaram a ser nossos amigos também. Aquelas pessoas finas, bem-postas e muito
educadas - como de forma simplista a minha saudosa mãe caracteriza os Martins e
seus amigos - chegaram a acampar nas imediações da Casa Florestal de Castelo
Novo!
Naqueles anos ainda não havia o conceito de Turismo na Natureza e
a Gardunha também não dispunha de um Glamping Natura. Mas os Martins que deixavam
a geografia do mar aviavam-se em terra para, comodamente, se instalarem na
serra. Esse jardim natural cujo foco de maior beleza eram os cedros sob os
quais existiam as mesas hexagonal e retangular com bancos de granito à volta e
que a cada dia de Verão eram bastante procurados pelos turistas!
Mas voltando ao João Martins. Esse Amigo que me viu crescer e
acompanhou o avanço da idade de meu pai, a perda de minha mãe, a minha ida para
a escola, o primeiro emprego e o jornalismo. O casamento e o nascimento de meus
filhos….
O João é hoje o mesmo homem charmoso e inteligente, brincalhão e
amigo do coração, mas está perder energia.
Há dias, nessa tal visita improvisada, que nasceu de
um forte aperto no meu coração, encontrei-o menos alegre, para não escrever triste.
Encontrei-o acabrunhado e desiludido com as consequências do avanço da idade.
Em boa verdade o João cabisbaixo que eu visitei este
novembro é também um homem desiludido com a vida e com os amigos que ainda
estão nesta vida. O João que há muitos anos visitava a Beira Baixa uma a duas
vezes por ano para levar cerejas do Fundão, azeites, queijo, azeitonas e
enchidos da Beira deixou de vir amiúde. Passou a vir mais espaçadamente. E
ultimamente já nem vem!
Deixou de conduzir. Entregou-se á dependência! E embora continue a
caminhar pela cidade de Lisboa, o homem que adora mar e peixe fresco de Setúbal
há muito que se desfez da casa localizada mais perto desse horizonte de
memórias povoadas da imensidão do mar que é como quem diz da plenitude da
amizade e dessa grandiosidade, às vezes finita, dos afetos.
E é diante tamanha circunstância que o João e outros como ele se
dão conta de como a amizade é afinal algo que pode ter os dias contados. E
quando assim acontece, seja por via da finitude do Ser seja por outras razões
que a realidade ainda não partilhou connosco, sentimo-nos mais sós. Foi essa
realidade que pude observar na tranquila e melancólica manhã de Outono quando a
cara-metade do João, de lágrima nos olhos, me segredava: Estamos sós. Cada vez
mais só.
Aquele instante caiu-me no coração como flecha que deixa marca e domina-me
o pensamento. Faz-me pensar noutros passos, pessoas e circunstâncias que de
igual forma me magoam e fazem pensar nas muitas pessoas que ao longo de uma
parte da vida se cruzaram comigo e subitamente perderam o meu contacto telefónico.
Preocupa-me este modo de ser e estar e na busca incessante por uma
explicação que atenue a minha dúvida lembro um poema de Vinícius de Morais sobre
a Amizade que evoca a singularidade do Ser.
Esse bicho, tantas vezes incompreendido!
E diz assim:
(…) Um Bicho igual a mim
Simples e humano
Sabendo-se mover
E comover
E a disfarçar com o meu (seu) próprio engano.
Seja como for o importante é constatarmos que ao longo da caminhada
nos fomos cruzando com outros bichos, às vezes ingénuos, capazes de acreditar
que o verbo pode dar lugar ao gesto.
Querido João e Mariette, nós - os Gabriel de Matos - estamos sempre
aqui para continuar a mimar-vos com um sorriso franco e farto ou com as couves
da Tapada do Caldudo que desta vez ficaram no Fundão.
“Foi pena que assim tenha
acontecido, pois quando te vi entrar logo pensei em cozinhar as couves do
Fundão”, disse o João que gosta de enviar flores e postais, ainda escreve
cartas e muitas vezes brinda a minha Leonor com o desenho, postal ou fotografia
de um golfinho.
Sim o João adora fotografia e ao longo da vida tirou-me muitas das fotografias que hoje enriquecem o baú da memória.
Obrigada João!
Sim o João adora fotografia e ao longo da vida tirou-me muitas das fotografias que hoje enriquecem o baú da memória.
Obrigada João!
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