Fernando
Sena o actor que é director e fundador de uma companhia de teatro que é um
exemplo de resistência à interioridade e à ausência de uma maior aposta na
produção cultural. ”Sou contra a menorização da cultura”.
Fernando
Sena, director do Teatro das Beiras, fundador da associação que deu origem à
companhia profissional de teatro. O GICC-
Grupo de Intervenção Cultural da Covilhã, fundado em 1974, e onde foi actor
e encenador. Foi um dos mentores de um projecto cultural ecléctico, que à época
era único na Beira Interior, pioneiro no combate ao analfabetismo. Na conversa
realizada na sede da companhia, Fernando Sena recordou os primeiros passos de
um projecto que assume como parte integrante da sua vida e elege a
profissionalização da companhia como o marco mais importante do projecto. O
primeiro espectáculo foi logo em 1975, mas a associação tinha uma intervenção multifacetada.
“Muito antes de se falar de analfabetismo, dinamizámos a alfabetização e houve
quem tenha feito o exame da quarta classe, após as aulas aqui realizadas”. A
realização em Agosto de O acto na
Montanha, permitindo a troca de experiência e aperfeiçoamento de
conhecimento no teatro e outras artes foi, durante dez anos, outro doa marcos
da companhia. Resistir “às inúmeras dificuldades criadas ao teatro e à cultura”
tem sido a estratégia. Aos parcos apoios financeiros que desde sempre marcaram
o apoio à produção cultural - ao contrato de financiamento assinada em 2009 com
a Direcção Geral das Artes, sucederam-se cortes que em 2013 chegaram aos 70% - junta-se
a interioridade. “Quando fizemos o primeiro festival, um camião com os cenários
demorava nove horas na viagem desde Lisboa à Covilhã. Hoje as viagens são menos
demoradas mas a vida das companhias no interior continua financeiramente muito
complicada. Seja pelo desinvestimento do Estado, seja pelo encerramento de
serviços. Sem elementos catalisadores decresce a população”. Apesar dos
contratempos Sena orgulha-se da panóplia de espectáculos realizados. “Mais de
duas mil e duzentas produções em 39 anos, uma centena de espectadores por
sessão”. Contestando o aparente divórcio entre o público e o teatro, Fernando
Sena sublinha o decréscimo de espectadores também no cinema e questiona se
“esse divórcio com a cultura não será, antes, um reflexo da formação das
pessoas e da sociedade em geral”. Ou no resultado da perda de poder de compra! Quanto
à estratégia de produção a aposta recai em nomes universais (Moliére e Goldoni) e “textos acessíveis”.
“Trabalhamos para o grande público e
também para as crianças. Também produzimos espectáculos a partir de textos mais
herméticos” mas que “têm uma grande qualidade e que pertencem a autores de
renome mundial”. Enriquecem a oferta da companhia profissional que ao longo dos
anos apresentou “quase 90 produções próprias”. Actualmente o Teatro das Beiras
tem em cena o espectáculo de Dário Fou,
“Pagar aqui Ninguém Paga”, que tem tido boa receptividade do público mas
“infelizmente não tem havido condições para fazermos circular mais peças a
nível nacional”. Embora a região e o país disponham actualmente uma rede de
- e infra-estruturas culturais a verdade é que de há “quatro ou cinco
anos a esta parte fazem-se menos espectáculos e digressão”. Enaltecendo o plano
de recuperação de cine-teatros nas capitais de distrito, Fernando Sena elogia a
estratégia do então Ministro da Cultura (Manuel Maria Carrilho) mas lamenta que
a construção de novos equipamentos (um por concelho) não tenha sido acompanhada
pela contratação de bons programadores. “A maioria das salas encontra-se
distante da actividade para a qual foi construída. Não estando abandonadas, são
salas sem uma oferta regular de produção profissional”. A recuperação do Teatro
Municipal da Covilhã que deverá ser uma das apostas do novo executivo do
Município da Covilhã, merece um alerta: “Espero que não se comentam erros idênticos
aos realizados pelo país em que se gastaram milhões de euros em salas com
problemas técnicos de todo o tipo. A programação deverá ser adequada à cidade e
não a preferência de uma ou duas pessoas”. O Teatro das Beiras está a fazer 39
anos, a caminho vem o Festival de Teatro, que nasceu em 1980 como Ciclo de Teatro de Outono, antevê-se uma
programação cultural à altura da credibilidade da companhia. Actualmente reúne
seis actores residentes, sonha com um espaço “mais digno para a apresentação de
espectáculos”. “Trabalhamos com muito bons actores que não beneficiando do
mediatismo das telenovelas são muito profissionais”. Embora a televisão seja um
enorme meio de difusão de actores, Fernando Sena queixa-se de que “ao nível do
espectáculo televisivo, não existe oferta de teatro. Nem na televisão pública!
Mas a mediocridade não se fica pela oferta das estações privadas, a pública que
é suportada por todos nós actua com a mesma ligeireza”, afirma. Em tom critico,
lembra o ”país da compra e vende-se que esqueceu a cultura. Para mim a cultura
faz parte da vida como um bem essencial”.
Publicado no Jornal do Fundão em Outubro de 2013
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