quarta-feira, novembro 27, 2013

Tratamento para abusadores sexuais precisa-se

“Sexo, Crianças e Abusadores” é o título de um livro que resulta da realização de uma investigação clínico-forense, no âmbito da conclusão do Mestrado em Psicologia Clínica e da Saúde na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da UBI. Um trabalho de Filipa Carrola que entre 2010 e 2011 se dedicou a uma investigação que ajuda a avaliar “a personalidade e saúde mental” do sujeito abusador.
O documento com prefácio de Barra da Costa (profiler criminal) poderá ser um contributo para a compreensão e promoção de acções de acompanhamento e cura dos abusadores sexuais. Por outro lado, a tese de mestrado ajuda a “desmistificar a confusão que existe na sociedade entre pedofilia e abuso sexual de crianças, e os mitos que criam um imagem estereotipada acerca do crime de abuso sexual de crianças, abusadores e crianças”. 
No âmbito do estudo foram ouvidos em contexto prisional “62 abusadores sexuais de crianças” que cumprem pena nos estabelecimentos prisionais da Guarda, Covilhã, Castelo Branco e Carregueira. No trabalho de campo a jovem investigadora ouviu ainda “63 sujeitos da população normativa, que foram avaliados em termos da sua personalidade e saúde mental, através da aplicação de dois instrumentos de avaliação psicológica (entenda-se, questionários). Para complementar o estudo e melhor caracterizar a amostra foi também aplicado a todos os sujeitos de ambos os grupos um breve questionário sócio-demográfico. Após a análise estatística concluiu-se que a média de idades dos abusadores sexuais foi “de 44 anos, sendo que 53,22% destes sujeitos tinha idade igual ou inferior a 45 anos. No que respeita à escolaridade, 48,38% dos abusadores estudados tinham escolaridade equivalente ao 2.º/3.º ciclos do ensino básico, 40,32% tinham escolaridade igual ou inferior ao 1.º ciclo do ensino básico e 11,29% tinham escolaridade igual ou superior ou ensino secundário”. Por outro lado, os abusadores em causa pertencem a “vários estratos socio-económicos e as suas competências sociais e culturais são variáveis. É um grupo heterogéneo psicologicamente afectado, pois ao nível da personalidade tinham dificuldade em identificar e gerir emoções”. São tendencialmente hostis e negativistas. Estão associados a problemas de alcoolismo e a um sub mundo quantas vezes criado pelos próprios e com base nas “fantasias e vícios” de cada um.
Filipa Carrola entrevistou cada um dos abusadores e em nenhum momento sentiu desconforto. Ainda assim sublinha a tentativa de cada um dos abusadores em justificar o injustificável. “Muitas vezes disseram que foram seduzidos pela vítima. Mas o relato mais marcante foi o de um jovem abusador que me disse ser o Messias e encarnando uma pessoa teria de dar carinho e afecto permanente às crianças”.
Apreensiva com o retrato dos abusadores, Filipa Carrola deseja que o seu trabalho académico abra caminho “ao tratamento dos abusadores evitando o crescimento das taxas de reincidência e protegendo mais as crianças”. A investigadora, natural da Covilhã, referiu ao JF ser imperioso “contrariar a ideia de que a prisão é o único tratamento penal para estes sujeitos, pois muitas vezes saem mais perigosos”. À semelhança do que acontece com os condenados por violência doméstica, em Portugal não há uma estratégia de tratamento dos criminosos/condenados. Filipa Carrola lembra a Convenção dos Direitos da Criança em que os todos os países se comprometem a legislar para prevenir todas as formas de violência sexual e a prevenção está também no tratamento, alerta! Ainda assim, sublinhe-se que em Portugal existe nos Estabelecimentos Prisionais de Paços de Ferreira, Carregueira e Funchal um programa de acompanhamento de abusadores sexuais mas cujos resultados práticos são desconhecidos. “Em 2011 pensou-se dar continuidade ao programa fora do contexto da cadeia”, conclui. Da investigação, que permitiu a Filipa Corrola um brilhante 19, resultou a publicação de um artigo numa revista de Criminologia no Brasil e dois capítulos na revista Portuguesa de Psicologia. Continuar o trabalho académico de investigação nesta área é o próximo passo da autora do livro “Sexo, Crianças e Abusadores, que se propõe tirar o Doutoramento e desenvolver as suas competências no acompanhamento dos abusadores sexuais. 

Publicado no Jornal do Fundão de 14 de Novembro de 2013

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