Um percurso igualmente traduzido em títulos honoríficos e de mérito como a comenda da Ordem Infante D.Henrique que lhe foi conferida em 2015 pela presidência da República ou a Medalha de Mérito Municipal do Fundão que lhe foi entregue pela Câmara Municipal. Realidades e factos que em nada alteram o modo de ser e estar do criador de moda que não se compromete com o futuro mas olha para o horizonte com a mesma garra que caracteriza o percurso iniciado num tempo em que abrir um atelier de moda numa cidade do interior de Portugal era um risco.
Eis, pois, o perfil de alguém que não convive bem com a fama mas admite ser um “embaixador de Portugal” no exigente e competitivo universo da moda. A partir do seu atelier damos a conhecer a caminhada de quem aproveita as deslocações a Londres, Nova Iorque, Paris ou Milão para momentos de “estudo e introspeção pessoal” com vista a novas coleções e desafios.
Entre a semana da Moda Feminina em Milão
que decorreu em fevereiro e o Portugal
Fashion que terá lugar no dia 17 de março em Lisboa vai quase um mês mas o
estilista fundanense Carlos Gil ainda está a digerir o êxito que a coleção “Twenty four Hours ” alcançou junto da
imprensa internacional que acompanhou o desfile que congrega “o maior número de holofotes” para a moda. "Foi a primeira vez"
que as apostas de Carlos Gil tiveram tão expressiva visibilidade nos jornais e
revistas de moda estrangeiras confessou ao Jornal do Fundão o designer de quem se fala. “Eu sabia que
um dia este reconhecimento haveria de chegar só não sabia quando”, revela-nos o
criador que faz dois desfiles por ano em Milão.
Um sonho que começou a
desenhar-se há quatro anos quando se encontrava de férias no Dubai e recebeu um
telefonema do então presidente do Portugal
Fashion que lhe disse «Carlos não sei onde está mas vai ter de vir para ir
a Milão, esta é a sua oportunidade». Passado uma semana estava no Fundão para preparar
uma coleção já com foco em Milão. “Planificar uma coleção obriga-me a desnudar
de tudo, desde preconceitos a estatutos e propor-me ao que é mais básico:
Mostrar o que é bonito, o que toda a gente vai gostar. Mas combinar novidade
com elegância e conforto exige um equilíbrio enorme. Nas minhas coleções não há
um desequilíbrio provocativo pois eu não procuro o bizarro para provar aos media que existe moda ou que existe a
marca Carlos Gil”.
“A marca Carlos Gil destina-se a um target de pessoas que gostam de moda. É
feita para mulheres que gostam de ser elegantes e se apresentam na vida com uma
postura muito própria. Têm de se sentir confortáveis. Nas minhas coleções gosto
de sobrepor e jogar com as cores, gosto muito de contrates”. O preto e vermelho
que caracterizam a imagem da marca “dão aquela sensação de bem-estar mal
estando, porque o preto dá-nos conforto e dá-nos paz e o vermelho
acrescenta-lhe imenso vigor e energia positiva”, descreve o estilista.
Carlos Gil recebeu-nos no seu atelier na avenida da liberdade no
Fundão no último sábado. No laboratório de moda do senhor comendador o ambiente
é primaveril. Na loja são visíveis os modelos da próxima estação e além disso o
jardim interior transporta - nos para a magia floral e verdejantes dos dias que
aí vêm.
Logo depois do Portugal Fashion em Lisboa, Carlos Gil cumprirá um dos objetivos da sua carreira de 19 anos de estilista. Em parceria com a arquiteta Inês Gavinho abrirá, dentro de semanas, a primeira loja em nome próprio. “Trata-se de um conceito que junta moda e arquitetura pois eu sou um apaixonado por arquitetura de exteriores e interiores. Quando me propõem essa parceria com a arquiteta Inês Gavinho que irá trabalhar com várias outras marcas como a «Boca do Lobo» que tem um estatuto internacional no designe de mobiliário só pode ser um desafio imenso”, sintetiza.
Logo depois do Portugal Fashion em Lisboa, Carlos Gil cumprirá um dos objetivos da sua carreira de 19 anos de estilista. Em parceria com a arquiteta Inês Gavinho abrirá, dentro de semanas, a primeira loja em nome próprio. “Trata-se de um conceito que junta moda e arquitetura pois eu sou um apaixonado por arquitetura de exteriores e interiores. Quando me propõem essa parceria com a arquiteta Inês Gavinho que irá trabalhar com várias outras marcas como a «Boca do Lobo» que tem um estatuto internacional no designe de mobiliário só pode ser um desafio imenso”, sintetiza.
A conversa flui e a forma como Carlos Gil
recebe a reportagem do JF faz desta edição de "Um Café com," uma
partilha de particularidades do nosso interlocutor. Poucos saberão da devoção
de Carlos Gil a Nossa Senhora. “Não sou pessoa de ir à missa com frequência mas
sou bastante crente e não entro no atelier
sem dar um beijo a Nossa Senhora como não entro em casa sem dar um beijo ao meu
Menino Jesus”, diz quem tem a imagem da Virgem Mãe à vista de todos os que
visitem o seu atelier. No mesmo
espaço cheio de luz e com janela para a serra da Gardunha também está a Medalha
de Prata de Mérito Municipal. Carlos Gil tem muito orgulho no seu Fundão,
cidade que lhe “dá imensa paz de espírito”.
Embora tenha nascido em Moçambique
há quase 50 anos, Carlos Gil não renega a sua geografia de afetos e a paisagem,
onde não consegue passar despercebido, é o lugar que o inspira e onde tem as
amarras para continuar a dar passos ponderadamente seguros. "Quando
há 30 anos disse à família que queria tirar um curso de moda foi de uma coragem
muito grande. Um individuo do interior ser reconhecido pelas grandes revistas
estrangeiras da especialidade é uma grande coragem. Não é para todos e se
pessoas anónimas um dia se inspirarem em mim isso deixar-me á satisfeito”,
verbaliza.
Carlos Gil é um perfeccionista e orgulha-se
de utilizar sempre matéria-prima de primeira qualidade. "Valorizo imenso o
pormenor, o interior de cada peça pois o que está em causa é o nome Carlos
Gil". Por outro lado a responsabilidade de representar o seu país não pode
defraudar as entidades que confiaram no meu trabalho. "E óbvio que quando
sou convidado para fazer um desfile na Polónia, no Dubai ou em Paris não é só o
meu nome que está em jogo mas sim o meu país", vinca. Um modo de ser e
estar que também é válido para as suas clientes. “Não costumo impor-me mas de
forma simples e educada eu explico a uma cliente que se vai de lantejoulas às
nove da manhã como é vai a uma festa à noite de calças de ganga! Para cada
situação há um compromisso de rigor para que essa pessoa se apresente bem
vestida”, explica-nos quem facilmente consegue criar empatia com as suas
clientes. “Procuro sempre o melhor modelo para que se sintam inteiras em
qualquer circunstância”.
Um modo de argumentação que encaixa na perfeição na
coleção outono inverno 2018/2019 cujas coordenadas se adaptam a quaisquer momentos
da mulher mãe e dona de casa ou da mulher executiva e poderosa. Um “trabalho coletivo” vinca o estilista que
se emociona quando fala da dedicação e empenho dos seus colaboradores. Carlos
Gil acompanha de forma minuciosa a confeção de todas as peças que saem do atelier. “Nada se faz sem os meus
olhos”, acrescenta o empresário que tem na esposa Carla Neto a retaguarda que o
projeto de criação, conceção e comercialização exigem. À equipa de sete pessoas
que trabalham no Fundão juntam-se mais seis pessoas que a partir de Milão e de
Lisboa cuidam da exportação e comunicação da marca.
À mesa do café que gentilmente nos serviu, vem à baila o
despovoamento do interior e a tenacidade de quem alavanca uma marca a partir do
Fundão. “O Interior está a morrer porque os
governos não o valorizaram de forma eloquente” acusa. "Enquanto não
tivermos um governo que olhe para a região, que foi altamente prejudicada ao
longo de dezenas de anos, permitindo que uma franja populacional de pessoas de
valor se mantenha onde tudo é mais difícil, continuaremos a ser poucos”, afirma
quem chega a pagar “mil euros de portagem por mês”, dada a necessidade de
desenvolver a sua atividade entre o Fundão e Lisboa.
Texto originalmente escrito e publicado na edição de 8 de março de 2018 do Jornal do Fundão